Uma resenha tardia e inevitável

No sábado, 27 de maio, o pianista Osmar Milito completou 82 anos. Uma semana antes, ele esteve em Fortaleza para uma apresentação no projeto Jazz em Cena, do Centro Cultural BNB. Tudo poderia soar pouco convidativo. A apresentação seria num sábado à noite, quando não faltam opções bem mais populares na Cidade. Há também o fato do show ter sido no Centro, sempre vazio e estranho (para alguns) nesse horário.

Contrariando as expectativas, uma fila imensa se acumulou na entrada do equipamento esperando o momento de entrar. À medida que essa entrada demorava, mais crescia a fila. Dali era possível ver casais, jovens, adultos, algumas poucas crianças, muitos artistas, todos certamente curiosos a conferir o show a seguir. Já com algum atraso, o público foi entrando naquele espaço que não perde a cara de improvisado, mas que é sempre muito acolhedor. Para dar assento a tanta gente uma equipe buscava mais bancos e cadeiras.

Como apresentar Osmar Milito para esse público? Houve quem reclamasse do tempo que o apresentador levou. “Tá bom, já chega”, gritou um menos cuidadoso. Mas a missão não é fácil, o pianista paulista já protagonizou cenas heroicas no instrumental nacional. Na estreia artística, em meados da década de 1960, tocou com toda a cena da bossa nova, de Sylvia Telles a Marcos Valle. Excursionou com Sergio Mendes pelos EUA. Dividiu o palco com gente como Tony Bennett, Pat Matheny, Liza Minelli, Sarah Vaughan… Ufa! Não é fácil, apresentador.

Em Fortaleza, Milito dividiu o palco com verdadeiros azes da cena instrumental cearense: Luciano Franco (contrabaixo), André Benedecti (bateria), Hermano Faltz (guitarra), Alex Moreira (trompete), Rogério Lima (violão) e o cantor Edinho Vilas Boas, que fez uma participação ao final. No repertório, clássicos do jazz, toques de MPB e parcerias novas de Milito com compositores locais.

Mais que sonhar, de Dalwton Moura, gravada por Kátia Freitas no disco Futuro e Memória, ganhou linda versão instrumental. Edinho, cercado de elogios de “melhor voz do Brasil”, cantou Se eu quiser falar com Deus, A saudade mata a gente e outras, com a simpatia de sempre. Teve ainda Cantaloup Island, Buster rides again e Amazonas, do mestre João Donato”.

Edinho Vilas Boas foi convidado para dividir o palco com Osmar Milito (Foto: Divulgação/Jazz em Cena/ CCBNB/ Lucas Benedecti)

É bom saber que, em meio a uma programação dominada por fórmulas pré-escritas e mal executadas, podemos encontrar na programação de Fortaleza um show de beleza hipnótica e com público farto. Melhor ainda saber que, enquanto se paga caro para ouvir mais do mesmo, o show de Osmar Milito foi gratuito. Um mestre da música brasileira que, por qualquer motivo, não goza da mesma popularidade que muitos dos seus pares. Não é por falta de talento, eu afirmo. Quem esteve lá no CCBNB pode confirmar.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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