Rachel de Queiroz e Nélida Pinõn (Foto: divulgação/ABL)

Em 4 de agosto de 1977, Rachel de Queiroz era eleita a primeira mulher a ocupar uma vaga na Academia Brasileira de Letras

Rachel de Queiroz foi eleita para a Academia Brasileira de Letras (ABL) em 4 de agosto de 1977. O conjunto de escritores e pensadores já tinha 80 anos de existência, mas nunca antes uma mulher havia colocado o famoso fardão. À época, explica o acadêmico Arnaldo Niskier, a cearense contou com o incentivo de Austregésilo de Athayde, presidente da ABL de 1959 até 1993. Rachel ocupou a posição 5 da cadeira 5 até morrer, em novembro de 2003.
O passo dado com a eleição de Rachel possibilitou que outras mulheres entrassem no espaço. Em 1980, a romancista Dinah Silveira de Queiroz foi eleita para a cadeira 7. “Mudou no sentido de que abriu uma porta. Rachel foi uma pioneira na Academia e de certa forma recebeu, naquele momento, em nome de todas as mulheres escritoras, o reconhecimento de umas das instâncias de validação do mundo literário”, reflete a pesquisadora Cleudene Aragão.

Hoje, a academia tem o maior número de mulheres em uma mesma geração: Cleonice Berardinelli, Rosiska Darcy de Oliveira, Lygia Fagundes Telles, Nélida Piñon e Ana Maria Machado, que já ocupou a presidência da casa.

Imortais da ABL

“Havia uma crença de que academia tinha sido feita só para acadêmicos, só para candidatos do sexo masculino. Era uma época de um machismo desenfreado. Rachel rompeu essa fronteira”, aponta Niskier, ocupante da cadeira 18 que foi recebido na ABL pela cearense. Para Jo A-mi, professora e pesquisadora da Unilab, é necessário refletir primeiro sobre o significado das academias para a vida de um artista. “Grosso modo, esses espaços são lugares de prestígio, força política e, depois, por vezes, talento”, pontua.

“Na ABL, por exemplo, dividem espaço, atualmente, figuras como José Sarney e Lygia Fagundes Telles, Marco Maciel e Cleonice Berardinelli. Sem dúvida, há em Lygia e Cleonice um peso muito maior para o talento nesta balança – o mesmo não se pode inferir para os outros dois citados. Mas isto quer dizer que as mulheres não devem ocupar esses espaços? Acho que não. Devem ocupá-los, desconstruí-los (ou destruí-los!) – afinal, Literatura não é a arte mortal do humano-falível, seara fluida do fingimento?”, completa Jo A-mi.

Rachel também integrou a Academia Cearense de Letras (ACL). Foi eleita em 1994, em virtude do centenário da instituição, e ocupou a vaga deixada por Moreira Campos na cadeira 32. Ubiratan Aguiar – presidente da ACL – diz que a escritora cearense levou a visão da menina da fazenda “Não me deixes”, em Quixadá, para dentro das academias. “Ela se consagrou no Brasil com o romance O Quinze e nos brindou com seu olhar de mulher”, acredita o presidente.

Rachel tomou posse na ABL em 4 de novembro de 1977. Mas, mesmo passados 40 anos, ainda são poucas as mulheres na academia em comparação ao número de homens. “Pela mesma razão que há menos mulheres parlamentares e em cargos do poder executivo, juízas, CEOs, escritoras publicadas: um mundo governado por homens, em que ainda há pouco espaço oficializado para as mulheres. Temos as mesmas capacidades, o mesmo talento na escrita, mas temos menos oportunidades. O mundo das academias ainda é um mundo machista”, pondera Cleudene Aragão.

Trajetória
A ABL tem 40 cadeiras. Ao longo dos 120 anos de existência da casa, apenas oito mulheres foram eleitas, incluindo Rachel. À época da fundação da ABL, a escritora Júlia Lopes de Almeida fez parte do grupo de intelectuais que planejou os moldes da instituição.

Ela estava na primeira lista de acadêmicos que deveriam assumir postos, mas foi excluída por ser mulher. Para o lugar onde deveria estar Júlia foi colocado seu marido: escritor Filinto de Almeida.

Rachel substituiu Cândido Motta Filho na cadeira 5 e foi sucedida por José Murilo de Carvalho, que até hoje ocupa a cadeira. Entre os trâmites para entrar na academia estão a preparação de um discurso de posse, feito pelo novo membro, e de um discurso de recepção, feito por
um acadêmico.