Ilustração: Jéssica Gabrielle Lima

Por Ayla Andrade*
Encaro as fotos daquele prédio ocupado e de seus então “ocupadores” como se visse o passado, outros tempos. Temos sido tão afeitos à acomodação, ao desmazelo, aos atos inertes, a opressão que qualquer movimento contrário, uma remada de braço contra a maré, parece estratégia de guerrilha de um povo distante.
Mas não. São os tempos de agora, os ossos e carne de agora, pulsantes, o fazer da arte nossa, na rua, no teatro, nos galpões, nas praças e becos. Onde antes a ordem era a produção laboral do cotidiano tomou-se um gosto de luta e café construído muito antes, mas que parece ter sido feito para aquele prédio. Antes era isso, um prédio e agora é um forte, uma fortaleza nossa, mesmo estando todos de lá ausente agora.

E não se faz uma fortaleza de mãos dadas? Um tijolo após outro, emendado por uma liga que nos une, uma força substrata, um segredo à boca miúda, mas que o coração extravasa na mais potente voz? Sim. E assim foi feito e tem sido.

Toque de tambor, junção de afetos, olho no eterno e irremediável porvir, a invenção, a criação, a partilha do prato, os objetos perdidos, o salto, o treino, o improviso são outros nomes e chamamentos para a luta. Não é uma negociação, não é para mim, não é para nós, mas para todos e todas nós.

Uma fortaleza existe se poder proteger o que se quer proteger. Se conquista o que quer conquistar. E essa fortaleza é nossa. Mas não essa Fortaleza armada, truculenta, como a que já conhecemos. É melhor, essa, a que é nossa. Erguida, imponente, orgulhosa,

conquistada, uma construção invisível que agora carregamos no peito, nos bolsos, nos sorrisos, nas falas e na qual, de agora em diante, nos apoiamos e miramos. E antes de ser arx é mesmo fortitudine porque nos cabe a todos e por nós foi levantada.

Sigamos agora, nessa senda aberta porque depois da fortaleza erguida, ocupar é mais que existir, é permanecer, com a arte costurada à vida e coração livre de medo.

Ayla Andrade

*Ayla Andrade é assistente social, cronista, contista e amante do cotidiano. Ela já publicou o livro Mais feliz dos silêncios (Editora Substânsia, 2014) e publicou contos em algumas antologias, entre elas Encontos e desencontos, Antologia Massanova e O cravo roxo do Diabo: o conto fantástico no Ceará.

 

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About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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