Se você não ouviu falar do livro A parte que falta, bem, você deve ter passado os últimos 60 dias abrigado em uma caverna. A obra de Shel Silverstein ganhou a internet após a youtuber Jout Jout lançar um vídeo com uma leitura comentada. O furor foi tão grande que o livro infantil chegou a ficar indisponível em algumas lojas.  A narrativa é simples: um ser sente falta de “uma parte” em si mesmo e sai em busca, rolando, até encontrar esse tal pedaço que possa ser usado para preencher o vazio.

O que falar sobre A Parte Que Falta após o vídeo da Jout Jout? Muita coisa! Classificado como livro infantil e publicado por um selo específico para esse estilo de livro – o Companhia das Letrinhas – o título de Shel Silverstein carrega múltiplas camadas. É um livro de texto simples, sem firulas e facilmente entendido por leitores de vários níveis, mas carrega delicadezas e sensibilidades impressionantes.

Ao longo da narrativa, o ser vai passando por vários lugares na busca por essa “parte faltosa”. Desertos, florestas, espaços vazios. Até que finalmente encontra um pedaço que parece lhe cair bem, mas esse não quer ser “parte de ninguém”. Que choque, não é? Quantas significâncias da vida adulta estão colocadas em apenas algumas páginas de livro infantil? Sim, nós buscamos, buscamos, buscamos e perdemos tanto tempo nessa corrida desenfreada que quase não sobra tempo para “as partes” que já estão por aqui.

Um dos méritos de Shel é não apresentar esses conceitos como uma “lição de moral” ou como um “exemplo para seguir”, mas apenas como um processo vivido por um personagem. Talvez por ser tão despretensioso em sua proposta, o livro consiga ser tão tocante. Prova disso são as milhares de pessoas que correram  – o verbo é esse mesmo, correr – para adquiri o livro de Shel Silverstein. Claro, não vou contar o resultado da “busca” realizada ao longo do livro. Digo apenas que, ao fim, o autor consegue arrematar a história de uma forma brilhante. É simples, mas é surpreendente, coeso e elaborado.

A Parte Que Falta é um livro feito para ser eterno. Aquele exemplar para manter na estante e pegar sempre que os dias estiverem muito difíceis. Ele é a prova de que um livro infantil não é um objeto cultural “simplório, bobo ou fácil”. Essa é uma ideia propaganda pelo senso comum em pensamentos como: “livro infantil é fácil de fazer”, “livro infantil em dez minutinhos tá pronto”, “livro infantil tem que ser besta mesmo”. Fazer livro infantil é complicado, exige dedicação, sapiência com as palavras e o poder de despertar o interesse dos pequenos leitores. Algumas escritoras falam sobre esse assunto aqui!

Repito uma frase dita pela Jout Jout: “Eu quero dar esse livro para todas as pessoas que eu conheço”. Para os amigos, para os vizinhos, para os alunos! A Companhia das Letras lançou a continuação do livro, A Parte que falta encontra o grande O. A tradução também é de Alípio Correa de Franca Neto. Vale destacar que o próprio Shel é responsável pelas ilustrações de ambos os livros.

Do mesmo autor, eu também indico Uma Girafa e Tanto, também publicação da Companhia das Letrinhas. Seguindo o mesmo estilo, Shel mostra a trajetória de um menino que acumula objetos (alguns podem ser comparados a problemas, sentimentos, sensações) em sua girafa. Ele quer tanto tornar o animal uma “girafa e tanto” que acaba esquecendo quais os valores realmente necessários.

Shel Silverstein

O norte-americano Sheldon Allain Silverstein, Shel Silvertein, nasceu em 1930, na cidade de Chicago. Em 1961, estreou com o romance Uncle Shelby’s ABZ Book, que despertou a curiosidade de um editor de livros infantis. Dois anos depois, Silverstein lançaria sua primeira publicação para crianças. Shel escreveu livros que se tornaram clássicos. O autor morreu na década de 1990, aos 66 anos.

O livro foi gentilmente cedido pela Companhia das Letras para o blogServiço
A Parte Que Falta
Autor: Shel Silverstein
Tradução: Alípio Correa de Franca Neto
Editora Companhia das Letras
Selo Companhia das Letrinhas
Preço sugerido: R$ 44,90

 

 

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

View All Articles