Por Isabel Filgueiras*
O mercado editorial brasileiro encolheu 21% nos últimos 12 anos. Essa crise que já ultrapassa uma década gerou perda de R$ 1,4 bilhão para o setor. Embora haja pequenos negócios e editoras independentes, o maior problema está nas grandes cadeias de livrarias. Juntas, a Saraiva, a Fnac e a Cultura possuem dívida de R$ 38 milhões, dinheiro que deveria ter sido repassado a editoras, segundo levantamento da Fipe.
Quanto mais as gigantes afundam, agravam o cenário para toda a cadeia produtiva. Sem o repasse de recursos, pequenos negócios vão à falência, demitem, diminuem as impressões. O resultado disso são menos títulos publicados e redução na produção. Entre 2016 e 2017, os lançamentos caíram 7,45%. Mais de 1.200 novos títulos deixaram de ser lançados.
“A crise das principais redes de livrarias no Brasil tem feito o mercado se adequar, com a diminuição do número de lançamentos. Evidentemente, isto tem impacto nas vendas, mas precisamos continuar a trabalhar na valorização do livro para reverter este quadro a médio prazo”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), Marcos da Veiga Pereira.
As três maiores livrarias, com lojas em shoppings e comércio virtual bem estruturado, são responsáveis por quase 60% do faturamento do mercado. Por isso, as editoras ficam em situação delicada. Se processam ou deixam de vender para os grandes distribuidores perdem seu principal canal com o consumidor.
Para o presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), Luis Antonio Torelli, a prática de descontos e concorrência pelo menor preço prejudicaram o setor. Ele diz ainda que o consumidor perdeu a noção de valor do livro, porque os preços são muito flutuantes.“ De uns tempos pra cá, nossos negócios passaram a competir pelo desconto. Chegamos ao ponto de ter best-sellers e Nenhum negócio resiste a uma coisa dessas. Quando um produto vai bem, a tendência é aumentar o preço, fizemos ao contrário e é um tiro no pé. Boa parte dessa crise é oriunda disso”, afirma.
Livreiros, varejistas e analistas evitam falar em prognóstico de melhora ou piora. A retração parece continuar, embora 2018 tenha trazido um pequeno alívio na queda de venda e faturamento, segundo dados divulgados pela Snel. Em julho de 2018, as vendas caíram 9% e o faturamento outros 3%. Ainda assim, o acumulado do ano mostra pequena melhora de 9% no lucro em comparação a 2017.
Livrarias
Apesar do mau momento do mercado, o setor mostra sinais de recuperação. De acordo com a organização da Bienal de São Paulo 2018, o ticket médio de gasto por pessoa foi de R$161,57, um crescimento de 33% em relação à edição anterior em 2016. A própria Saraiva, responsável por cerca de R$ 28 milhões de dívida (de R$ 38 milhões das livrarias), anunciou que contratou consultoria para rever gastos e custos operacionais.
A escritora e professora de especialização Marília Lovatel afirma que é importante continuar a promoção de eventos literários e movimentos de incentivo. Ela lembra que o edital do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) prevê a compra de livros de literatura pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) para 2020. O governo ainda é um dos maiores consumidores de livros no Brasil. “Talvez ofereça algum fôlego para um mercado ofegante, necessitado sim de políticas públicas de incentivo à leitura e à publicação”, avalia.
“Os coletivos de escritores se multiplicam pelo país, os cursos de formação em Escrita Literária ganham reconhecimento no universo acadêmico, os grupos de leitura se reúnem, movimentos da iniciativa privada democratizam o acesso ao livro, tudo isso se soma às políticas públicas e forma a resistência à crise. Para o tamanho do desafio só mesmo um grande esforço conjunto tem a chance de responder”, completa Marília.
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*Isabel Filgueiras é jornalista, correspondente do O POVO em São Paulo e autora do livro Recortes da Diáspora Síria, publicado pela Editora Dummar. Viajou por vários continentes buscando histórias de refugiados, construindo amizades e estudando idiomas. Seu Trabalho de Conclusão de Curso foi premiado no Prêmio Gandhi 2015.