Por Bruno Paulino

Mailson Furtado Viana

Uma noite de julho de 2018.

Eu já conhecia muito bem o poeta e ator teatral Mailson Furtado antes de me encontrar com ele no Rio de Janeiro para degustar umas cervejas nos barzinhos boêmios do bairro da Lapa numa noite memorável. Por mais que me esforce agora não consigo lembrar quando foi nosso primeiro contato, provavelmente em alguma feira literária em Fortaleza, sei que logo ficamos amigos e trocamos nossos primeiros escritos. Tínhamos muito em comum, mas dois fatos uniam mais ainda nossas trajetórias e angústias: jovens escritores com os primeiros livros publicados e nascidos e ainda residentes em cidades pequenas do interior do Ceará, Mailson de Varjota e eu de Quixaramobim.

Quando combinamos de nos encontrar nas férias no Rio de Janeiro havia pouco tempo que Mailson tinha me mandado um dos 300 primeiros exemplares do livro À cidade, que fez publicar por sua conta. Com a tocante e gentil dedicatória – bem ao seu estilo: “Ao grande amigo e companheiro das letras, Bruno Paulino, com imenso apreço está cidade que também é tua. Abraços. Um hoje desta vida no Sertão cearense”.

Eu tinha lido com a devida atenção o livro do Mailson, e relatei nessa noite ao poeta que tinha ficado com a impressão que Varjota fosse Quixeramobim, e assim nos seus versos reconhecia a cidade dele na minha. Afinal, o sertão é sem porteiras. O sertão é o mundo. E a poesia de Mailson, que tão bem cantou a sua aldeia pode-se dizer que é, de fato, universal. E ali naquela mesa entre cervejas não éramos nada mais que dois telúricos em terra estrangeira, dois matutos a pensar a cena literária do Ceará. Fizemos pilheria com essa imagem.

Lembro que conversamos muito sobre os desafios dos escritores de nossa geração e da necessidade de estarmos perto e encurtar as distâncias do que era produzido no interior para o que era produzido nos grandes centros; e como fazer essa produção circular pelo menos em Fortaleza. E claro, falamos também do livro Cinco inscrições da mortalidade que estávamos organizando junto com os poetas Renato Pessoa, Dércio Braúna e Alan Mendoça. Livro que publicamos em novembro com esse objetivo de união e comunhão de poesia, através da Luazul edições do amigo Silas Falcão.

Nessa noite muitas cervejas já derrubadas, o Mailson me disse:

– Bruno, fiz a inscrição do livro À cidade no prêmio Jabuti, gastei uma grana.

Minha primeira reação descrente e mesquinha foi dizer:

– Macho, tu é doido? Devia ter gastado esse dinheiro com cervejas aqui. Será que eles vão pelo menos ler o teu livro independente num prêmio do mercado feito para o mercado?

Mas logo terminei de falar e a consciência me soprou que não devia ter dito aquilo, pois se o Mailson acreditava quem seria eu para roubar-lhe a esperança? Imediatamente me levantei, fui ao balcão do bar e comprei uma cerveja de banana e na volta fiz todos que estavam na mesa brindarem enquanto eu profetizava feito um Antônio Conselheiro ébrio:

– Mailson, essa cerveja de banana é uma das melhores cervejas que já tomei. Eu vou pagar essa daqui em sua homenagem e ao trabalho que você já faz como escritor e ator teatral, mas quando tu ganhar o Jabuti vai ter que pagar um monte delas pra mim.

Noite de 8 de Novembro de 2018.

Mailson manda uma mensagem no grupo do whatsapp, visualizo e ouço o áudio:

– Ganhei o Jabuti, porra!

Enchi os olhos de água e saí na rua atrás de comprar cervejas de banana para comemorar. Mailson ganhou o prêmio Jabuti, sem dúvidas por conta do seu inquestionável talento e do tesouro puro que é seu livro para a literatura brasileira, mas usando, sobretudo a mais poderosa das armas: a humildade.

***
Bruno Paulino é cronista e aprendiz de poeta.

 

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Colaboradores LDB

Colaboradores do Blog Leituras da Bel. Grupo formado por professores, escritores, poetas e estudiosos da literatura.

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