Nunca gostei de fazer parte de torcidas organizadas, sejam elas de futebol, política ou qualquer outra. Instintivamente eu refugo o espírito de manada e temo multidões.

Um homem na multidão é capaz de incentivar um suicida a pular no vazio; ao mesmo tempo – se estivesse só – teria comportamento inverso. Alguns, individualmente, seriam capazes de pôr a própria vida em risco para salvar o semelhante; a multidão é capaz de linchamento.

Por isso, desprezo-os todos, esses bandos de cachorros loucos – da direita à esquerda – que vagam pela internet atrás de uma presa para estraçalhá-la.

O nariz-de-cera é para dizer que nunca me pus entre os amantes do presidente da Venezuel, Hugo Chávez e nem entre o que o odeiam. Prefiro a análise.

Mas sempre afirmei – entre uma e outra ponta – que o caminho trilhado por Chávez tendia a levar a uma escalada da intolerância e da censura. Os que querem nos salvar são capazes de qualquer coisa, inclusive nos matar, se duvidarmos de suas as boas intenções. A rigor, não estou falando nenhuma novidade, basta olhar um pouco a história.

Leio agora, nas agências de notícias, que a Venezuela está para aprovar uma nova lei de imprensa. Entre outras coisas, punirá com até quatro anos de prisão quem veicular informações consideradas falsas ou manipuladas, que causem “prejuízo aos interesses do Estado” ou atinjam a “moral pública”.

O artigo 5º do Projeto de Lei Especial Contra Delitos Midiáticos estabelece que “toda pessoa que divulgue através de um meio de comunicação social notícias falsas que ocasionem grave alteração da tranquilidade pública, pânico na população ou que produza prejuízo aos interesses do Estado terá pena de prisão de 2 a 4 anos”. A mesma pena receberá quem “manipular ou tergiversar a notícia”, “lesionando a paz social, a segurança nacional, a ordem pública e a saúde mental ou a moral pública”.

A nova lei acaba, na prática, com o sigilo da fonte – o direito que o jornalista tem de preservar o nome de quem lhe repassa informações -, algo crucial para o trabalho da imprensa.

Além dos jornalistas que ficam ameaçados, mas também conferencistas, artistas e “qualquer outra pessoa que se expresse por qualquer meio de comunicação”.

O texto define ainda como “delitos midiáticos” as ações ou omissões que firam o direito a informação “oportuna, veraz e imparcial”. Capitula como crime o uso de meios de comunicação de modo a afetar a “segurança e a independência da nação” ou para gerar “sensação de impunidade ou de insegurança”.

Observem que são termos vagos que cada autoridade poderá interpretar da forma que quiser. A rigor, não existe como dar uma notícia sem “manipulá-la”, pois não há como transportar a realidade inteira para as páginas de um jornal ou para a tela de uma TV. Isso possibilita que a simple edição de uma notícia, por exemplo, passe a ser considerada crime.

Como se saberá, ademais, se uma notícia vai atingir a “saúde mental” ou a “moral” pública? Como definir o que é “imparcial”. Será considerado “parcial” – e por isso punido – aqueles que elogiarem indevidamente Chávez?

Agora, você pode perguntar: a) quer dizem então que a imprensa pode fazer tudo?; b) que dizer que é proibido fazer leis relativas à imprensa?

Para a primeira pergunta a resposta é não: existem leis a que o cidadão pode recorrer caso se veja ofendido. no Brasil, por exemplo, o Códio Penal e o Código Civil. Para a segunda perguta a resposta é que pode sim haver lei de imprensa. No Brasil se discute a criação de uma lei específica, depois que o STF derrubou a que foi criada no período da ditadura. Mas a lei não pode querer se meter a regular o modo como o jornalista vai trabalhar e nem o que ele pode e não pode escrever.

A Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos resolve isso de maneira brilante, estipulando o seguinte:

“O Congresso não fará lei relativa ao estabelecimento de religião; ou que limite a liberdade de expressão ou de imprensa; ou o direito do povo de reunir-se pacificamente e de dirigir petições ao Governo para a reparação de seus agravos.”

No Brasil

Aqui, no Brasil, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), está se encarregando da censura. Por decisão do desembargador Dácio Vieira,  o jornal O Estado de S. Paulo e o portal ficaram proibidos de publicar reportagens que contenham informações da Operação Faktor, mais conhecida como Boi Barrica.

O recurso judicial, que pôs o jornal sob censura, foi apresentado pelo empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

O senador Sarney, por sua vez é “jornalista”, colunista da Folha de S. Paulo e proprietário de jornal e TV no Maranhão.

No YouTube é possível ouvir um dos áudios que o jornal O Estado de S. Paulo está proibido de reproduzir em seu jornal e de divulgar em seu portal.

É um educativo diálogo sobre o patrimonialismo brasileiro, entre Fernando Sarney e a filha acertando um emprego no Senado para o namorado dela.

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