A seção “Painel” do jornal Folha de S. Paulo [edição deste domingo, 6/12/2009] informa que já há votos suficientes na Câmara Federal para aprovar a volta da obrigatoriedade do diploma de Jornalismo para o exercício da profissão:
«Fênix 1. Já existem votos suficientes na Câmara para aprovar o projeto que ressuscita a obrigatoriedade do diploma de jornalista, derrubada em junho passado pelo Supremo Tribunal Federal.
Fênix 2. No núcleo do governo, há quem enxergue a tramitação do resgate do diploma como laboratório para avaliar a viabilidade de aprovação de projeto para estabelecer o “controle social” dos meios de comunicação.»
Comentário
Do mesmo modo que uma “certa esquerda” demoniza a mídia comercial; uma “certa direita” acha que qualquer medida estabelecendo critérios para o funcionamento dos meios de comunicação é “censura” ou “ditadura”.
Assim, para os primeiros, quem é contra a obrigatorietade do diploma – ou defende outro modo de regulamentar a profissão – está “a serviço dos patrões”.
Para os segundos, quem ousa dizer a mídia precisa funcionar obedecendo a determinados critérios – como acontece em todos os países democráticos do mundo – é “chavista” ou canditado a ditador.
Entre um extremo e outro, só me resta lamentar que o Legislativo aprove esse prêmio à mediocridade das faculdades picaretas. Elas só se proliferam por causa da obrigatoriedade. Sem ela, as boas faculdades continuarão prestando bons serviços e as médias ou melhoram ou fecham. Mas, no país onde o que não é proibido é permitido e o que é facultativo só pega se for obrigatório (tipo ponto facultativo), o que vale enfim é a obrigação cartorial de ter o canudo embaixo do braço – mais do que uma formação mais sólida.
A rapidez com que o projeto está tramitando deixa claro que os políticos, como sempre, querem agradar os que têm poder. Trata-se, portanto, de mais uma demonstração da força do lobby corporativista da categoria.
Não se justifica tanta urgência, afinal, temos muitas outras prioridades paralisadas no Congresso, devido, justamente, à inércia do nosso legislativo.
Decididamente, o mundo não iria se acabar por falta de jornalistas diplomados.
A propósito da polêmica levantada sobre a necessidade de diploma para o exercício da profissão de jornalistas, vale registrar aqui a “Parábola dos urubus” do professor Rubem Alves. Estou citando de memória, mas o sentido é o mesmo:
Os urubus resolveram aprender a cantar. Contrataram os melhores professores – todos pós-graduados – e passaram a reunir-se, diariamente, sobre um telhado, para as aulas (teóricas e práticas). Todos os dias era aquela canseira… Os professores dando aulas, ensinando técnicas e mais técnicas, e o que mais os urubus conseguiam era uma séria de “Grr, Grurrr, Gorr”, e outros sons do tipo. Uma coisa horrível. Mas os urubus não estavam nem aí (nem os professores). O certo é que, passados dois anos de grandes esforços, dois anos de bunda na cadeira, digo, de penas no telhado, chegou o grande dia da formatura. Todos reunidos (alunos e professores) os discursos de sempre, diplomas debaixo das asas, orgulho pingando…, empáfias, mil. Desde então os urubus se reuniam sobre o telhado, duas vezes por semana, para “cantar”: “Grr. Grurrr. Gorr” – e vamos nós, pois elite é elite e quem pode, pode; e quem não pode se sacode.
Certo dia enquanto os urubus estavam reunidos “cantando”, eis que pousa próximo a eles numa quina do telhado, um sabiá. Inadvertidamente, sem saber que estava “usurpando” espaços alheios, o sabiá, natureza pura, solta aquele canto maravilhoso! Os urubus, indignados com aquela intromissão, interrompem o canto do sabiá e, dedos em riste dirigidos à pobre ave canora, gritam em uníssono (voz de barítono):
TEM DIPLOMA???????
O sabiá toma um susto, interrompe seu maravilhoso canto e, assustado, ao tempo em que balança a cabeça para um lado e para o outro, responde baixinho: n…ão, senhor…
Os urubus, com voz de barítono gritam em uníssono:
ENTÃO CALA A BOCA, SEU PÁSSARO DESPREPARADO!!!!!
Mutatis Mutandis…