Reprodução do artigo publicado na edição de 2/10/2014, do O POVO.

Liberdade de expressão: os santos e os pecadores
Plínio Bortolotti

Como muitos que assistiram ao debate entre os presidenciáveis na TV Record, também fiquei horrorizado com as referências insultuosas que o candidato Levy Fidelix fez aos homossexuais. Vi, também, com desgosto, na sequência, uma enxurrada de posts no Twitter clamando pela prisão do candidato. Fiz um post, naquele momento, ao estilo informal da rede: “Fidelix fala uma imbecilidade e já tem gente querendo prendê-lo. Eita”.

Não canso de surpreender-me com esse extremismo “politicamente correto”, que age com o intento de calar discursos divergentes, partindo, normalmente, de uma certa esquerda que tem o hábito de lançar impropérios contra a “censura” da “imprensa burguesa”. Mas não apenas: há também os “bem intencionados” – não menos assustadores – que querem livrar o mundo de todo o mal, tornando-o um lugar asséptico. A desculpa – de uns e de outros – é que defendem a liberdade de expressão, mas que Fidélix teria “incitado ao crime” ao pronunciar um “discurso do ódio” e, por isso, deveria ser levado às barras dos tribunais.

Passei uma lupa no discurso do candidato. O máximo que ele disse, que poderia ser interpretado como um estímulo à violência, foi o apelo para “enfrentar essa minoria” (os homossexuais). Porém, no discurso político, “enfrentamento” não significa, necessariamente, “vias de fato”, como diria a crônica policial. Ele não gritou, por exemplo, “fogo” em um auditório lotado, sem haver perigo do incêndio, o que caracterizaria conduta criminosa.

Outro argumento de que se valem aqueles com ânimo censório é que “não existem direitos absolutos”. Certo. Mas a liberdade de expressão é um bem tão frágil e tão precioso, que tem de ser preservada com vigor. “A liberdade, se é que significa alguma coisa, significa o nosso direito de dizer às pessoas o que elas não querem ouvir” – concordo com George Orwel, e acrescentaria: o direito de dizer e o dever de ouvir.

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