Reprodução do artigo publicado na edição de 26/2/2015 do O POVO.
Doações perigosas
Plínio Bortolotti
Nos mais diversos segmentos, incluindo o Legislativo, há consenso sobre a necessidade urgente de uma reforma política. Porém, existem grandes divergências sobre o tipo de mudança almejado. Por isso, há tempos, o tema se presta a muita conversa e nenhuma decisão.
Um dos nós que atrasam as mudanças é quanto ao modo de se financiar as campanhas eleitorais; essencialmente, se o financiamento deve ser público, se o sistema deve ser misto, e se as empresas poderão fazer doações, como ocorre hoje. Na sessão temática que o Senado fez na terça-feira sobre o assunto, um dos principais temas foi esse. Houve consenso sobre a necessidade de se limitar o volume de recursos despendido, pois todos parecem assustados com o espantoso rio de dinheiro que irriga cada disputa. Porém, permaneceu a divergência na forma como se daria o financiamento.
É claro que o fim das doações empresariais não acabará com a corrupção. Porém, fechará uma dos principais escoadouros por onde se esvaem criminosamente os recursos públicos. Sim, pois, em muitos casos, o dinheiro “doado” às campanhas, retorna ao “doador” por vias obscuras: escolha um dos escândalos no jornal de hoje para comprovar.
Para a sessão do Senado foi convidado o ministro Gilmar Mendes, do STF. Ele disse que, mesmo o Supremo sendo chamado a opinar sobre diversos aspectos da legislação eleitoral, fazer mudanças na lei cabe ao Legislativo, no que ele tem razão. (Mas bem que o ministro poderia liberar a ação direta de inconstitucionalidade que tramita no STF, proibindo o financiamento de campanhas por empresas. A ADI já recebeu seis votos favoráveis – a maioria -, porém Mendes pediu vistas do processo e o retém há dez meses.)
Por sua vez, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) disse que vai procurar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para conversar sobre os procedimentos necessários para acelerar a votação da reforma política. Que tenha sucesso.
Dois requerimentos da Câmara encontrados pelo GLOBO reforçam as acusações do doleiro Alberto Youssef que relacionaram o esquema de propina na Petrobras ao presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Em seu depoimento de delação premiada, revelado na noite de sexta-feira, Youssef afirmou que Cunha era um dos beneficiários das propinas vindas da estatal, mais especificamente em um contrato de aluguel de um navio-plataforma das empresas Samsung e Mitsui, que teria como representante no Brasil o executivo Júlio Camargo, que também está fazendo delação premiada.
Dois documentos da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara mostram que, conforme disse Youssef, aliados de Cunha fizeram pressão pública sobre a Mitsui e sobre Camargo. O motivo, segundo o depoimento, seria uma suposta interrupção no repasse de propinas para o partido.
No depoimento, o doleiro explica que Camargo tinha a atribuição de repassar parte da comissão recebida das empresas ao PMDB, mas, durante o aluguel do navio-plataforma, o pagamento de comissão ao executivo teria sido suspenso.
Camargo, por sua vez, interrompeu as transferências que fazia para o PMDB por meio de Fernando Soares, o Fernando Baiano, apontado como operador de Cunha e do PMDB na estatal. Diante da seca, o doleiro diz que Eduardo Cunha pediu “a uma Comissão do Congresso para questionar tudo sobre a empresa Toyo, Mitsui e sobre Camargo, Samsung e suas relações com a Petrobras, cobrando contratos e outras questões”.
Segundo o doleiro, “este pedido à Petrobras foi feito por intermédio de dois deputados do PMDB”.
A Mitsui e Júlio Camargo foram realmente alvo de deputados aliados de Cunha em 2011, durante o período em que ocorria o esquema de desvios na estatal. A então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), que hoje é prefeita de Rio Bonito, ingressou em 7 de julho de 2011 com dois requerimentos da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara — que foram apoiados pelo então presidente da Comissão, deputado Sérgio Brito (PSD-BA) — solicitando quase textualmente o que afirma Youssef. reforma por uma camara que tem em seu presidente achacalhador de plantão, pode se chamar outra coisa.
O episódio da saída espalhafatosa do Ministério da Educação teve muito de cálculo político para a família Gomes. O irmão mais novo, Cid Gomes, deve ser o escolhido para representar o clã numa eventual disputa presidencial em 2018.
A família já teve Ciro Gomes, 57 anos, duas vezes candidato ao Palácio do Planalto (1998 e 2002). Agora, Cid, de 51 anos entrou na fila.
A ideia é simples e tem passado na cabeça de inúmeros políticos: a) O PT está desgastado com o governo de Dilma Rousseff se segurando pelas tabelas até 2018; b) o PSDB está em constante crise de personalidade e não consegue de fato incorporar o desejo de mudança que existe na sociedade; c) finalmente teria chegado a hora de haver uma terceira via.
Marina Silva (ex-PT, ex-PV, momentaneamente no PSB e a caminho do Rede Sustentabilidade) já tenta ocupar esse espaço.
Para os Gomes, a ex-senadora pelo Acre e candidata duas vezes a presidente (2010 e 2014) não preenche no imaginário do eleitor todos os requisitos para ocupar o Palácio do Planalto –entre outras razões por nunca ter sido eleita para exercer função executiva.
Cid Gomes (ex-PMDB, ex-PSDB, ex-PPS, ex-PSB e hoje no minúsculo Pros) pretende preencher a demanda falando o que acredita que os eleitores querem ouvir: críticas fortes ao sistema político, como as que fez recentemente ao Congresso, dizendo que ali há de 300 a 400 achacadores.
Cid estava ministro da Educação e perdeu o cargo na última quarta-feira (18.mar.2015). Ele foi até o plenário da Câmara e reiterou suas críticas aos deputados. Apontou o dedo para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
No micromundo da política, em Brasília, Cid foi visto como intempestivo e irresponsável. Para os eleitores que frequentam a internet, a avaliação foi diversa.
Do dia 18 até 13h de ontem, sexta-feira (20.mar.2015), o ex-governador do Ceará Cid Gomes “conseguiu 78.518 menções no Twitter, 2.138 em sites de notícias, 1.699 em blogs e 83 em fóruns abertos”, segundo levantamento da consultoria Bites.