Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 20/3/2016 do O POVO.
A política e a nuvens
Plínio Bortolotti
Como já expliquei por aqui, devido aos prazos industriais de fechamento (dia e hora de enviá-lo à gráfica), o meu dead line (dia em que tenho de entregar o texto) é terça-feira, pois o “People” é considerado um caderno “frio”, isto é, não depende das notícias mais recentes.
Incomodo o leitor com essas considerações técnicas, pois, na velocidade em que as coisas (des)andam, um texto de análise da conjuntura pode rapidamente ficar “velho”: o que era ontem pode não ser hoje; o que era algumas horas atrás, pode esboroar-se.
Vejam vocês: o impeachment inflou-se, depois murchou; agora incha de novo; o Ministério Público, eleito o novo Batman depois de Joaquim Barbosa, levou uma cacetada ao pedir a prisão preventiva de Lula; o próprio juiz Sérgio Moro, que está acima dessas questões mundanas, sentiu necessidade de justificar a “condução coercitiva” do ex-presidente.
Amanhã, quem sabe, como nuvem ao vento a política pode mudar e “Tudo o que era sólido se evapora no ar, tudo o que era sagrado é profanado, e por fim o homem é obrigado a encarar com serenidade suas verdadeiras condições de vida e suas relações recíprocas”.
O PT, que surgiu de uma mescla do sindicalismo do ABC, lastreado pelas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica; juntando os sobreviventes da guerrilha urbana de 1968 e os ariscos trotskistas, tinha uma cara socialista, esquerdista. Lula, barba cerrada, cara zangada, igual à do João Ferrador – “Hoje eu não tô bom” – o bonequinho símbolo do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo.
Dizia o PT que não ia pagar a dívida externa; que ia fazer a reforma tributária; que rico ia, finalmente, pagar imposto; prometeu a reforma agrária, o agricultor agora ia ter terra; e que, também, iria acabar com a corrupção e com a farra dos empreiteiros etc. Assim, exaltava o lema nas eleições: “Trabalhador vota em trabalhador”.
Depois, o PT percebeu que a revolução não é um desejo inato dos operários, portanto, era preciso ir mais devagar com o andor, por etapas.
Juntando isso com o namoro que Lula iniciava com empresários – seus antigos desafetos nas greves -, o futuro presidente (na época) transfigurou-se no “Lulinha paz e amor”, escreveu uma carta aos banqueiros, quero dizer, aos brasileiros, para “acalmar os mercados” e trocou o repto “trabalhadores” por “povo”, mais abrangente e inclusivo; pois “povo”, no sentido lato, todo mundo é, até o 1%.
Assim, a “carta ao povo brasileiro” chamou a um amplo acordo “suprapartidário”, que veio a desaguar no famoso “presidencialismo de coalização” que, diferente da promessa inicial, sempre foi superpartidário – e nos trouxe ao enrosco atual. Pois manter essa unidade artificial, com uma dezena de partidos ávidos por cargos e mais algum troco, sai por um preço político muito alto, se é que me entendem.
É claro que não foi o PT que inventou esse mecanismo (a frase é só para provocar os que me acusam de ser “petista”). A carta de Lula foi só um pedido para entrar no arranjo de poder que já estava montado: o acordo por cima, o uso do Estado como se fosse propriedade particular e tudo a mais daí decorrente, inclusive aquilo que você está pensando. (Dentro, em vez de desmontá-lo, o PT deu um jeito de lubrificá-lo).
Como a burguesia (pode chamar de “elite”) é um bicho inteligente, percebendo que a força do líder sindical estava se tornando irresistível, aliou-se a ele. E, como escrevi na semana passada, tolerou-o no clube, sem aceitá-lo.
Na primeira curva, quando percebeu o animal ferido, a elite alvejou-o com acusações daquilo que era um hábito enraizado deles, mas intolerável no intruso. E, esperta (ou covarde?), começou a desembarcar do navio avariado.
No mais, como escreveu Luis Fernando Veríssimo, “azar do PT, que foi se meter na farra dos compadres justamente quando chegou a polícia”.
NOTAS
Karl Marx e Friedrich Engels
O trecho citado no quarto parágrafo é do “Manifesto Comunista” (1848), de Karl Marx e Friedrich Engels, em que eles falam da dinâmica do sistema capitalista. Portanto, dei uma forçadinha para encaixar ali a citação. Mas creio que nenhum dos dois se incomodaria.
Procuradores
Agora, creio que Marx não gostaria de ver seu amigo Engels confundindo com Hegel, como fizeram os procuradores de São Paulo ao pedirem a prisão de Lula. Marx foi discípulo de Hegel, depois rompeu com ele, mas continuou respeitando-o, mesmo sendo duro ao criticá-lo.
Créditos
Manifesto Comunista; Transfiguração, de Luis Fernando Veríssimo.
Infelizmente o texto é carregado de um Dom quixotismo impressionante. Para o jornalista Lula é o que é por causa dos outros (burgueses). Logo ele, Lula, seria mais uma vítima da elite que subverteu o proletário. A mim parece que o PT ao invés da guerrilha armada , como queriam os movimentos armados das décadas de 60 e 70, preferiu como uso e estratégia os ensinamentos de Antonio Gramsci, ou seja, “vamos comer pelas beiradas”. Assim como o lobo que se veste de ovelha as idéias revolucionárias de esquerda se fazem de vítima para cooptar mentes susceptíveis.
A ideia de luta de classes entre proletários e burgueses (elite) que, gradualmente, abre alas para as mais distintas lutas de grupos: lutas de raça, lutas de gênero, lutas de credo, etc… é falsa. Com a pseuda ideia de lutar pelos interesses dos “subjugados” e “oprimidos” ilude e mente (parece ser uma virtude do PT, PSOL, REDE, PCO, PSTU, PCdoB, etc) a “classe operária”.
O problema, para esses grupos, é que, ao contrário do que se “eles” acreditam, o capitalismo não é um sistema dividido em castas rígidas, onde o grande culpado pelo indivíduo da base da pirâmide não subir nessa hierarquia seja o próprio sistema. Mises explica que o capitalismo (de livre mercado), na verdade, permite que os indivíduos não apenas subam, como desçam nessa escala supostamente arbitrária de classes. E essa era até então uma concepção inédita na história da humanidade: o capitalismo foi o primeiro sistema econômico adotado em larga escala a permitir a mobilidade social. Membros da base da pirâmide que obtém sucesso em atender as demandas da população, melhoram sua situação econômica. O efeito contrário pode acontecer aos mais ricos.
O capitalismo de livre mercado é um sistema dinâmico de ascensão e queda social. E mais do que isso: é um sistema que continuamente enriquece a sociedade como um todo. O cidadão mais pobre do atual continente europeu vive com mais conforto que qualquer rei da Idade Média. A sociedade não apenas não é composta por castas, como tampouco é conflitante entre si. O que temos são indivíduos trabalhando para atender as demandas de outros indivíduos para, através dessas trocas, melhorarem suas próprias condições.
Lula não é Quixote . Lula é fruto de K. Marx, onde alguém deve trabalhar, para manter a boa vida do “pai dos Pobres”.
P.S. Segundo a Forbes Fidel Castro é o sétimo governante mais rico do mundo, com uma fortuna calculada em US$ 900 milhões. ” E viva a revolução!”
Sugiro também a leitura.
“O fugitivo, a rainha e os cidadãos
Curioso que o rei apresentava-se como metalúrgico, embora o tenha sido em um período curtíssimo de sua vida
O fundador de uma dinastia partidária tinha subido na vida política graças a seu carisma pessoal, que o tinha levado ao trono. Em época nem tão remota, contou com a ajuda de um partido que ajudou a criar, da Igreja que o apoiava e de um conjunto de intelectuais desgarrados com a queda das monarquias comunistas, ditas populares.”
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/o-fugitivo-rainha-os-cidadaos-18915801#ixzz43Xru8KeO
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Enquanto cursava direito na Universidade de Berlim, Karl Marx teve contato com a obra do filósofo Georg Wilhelm Friedrich Hegel, que foi professor e reitor dessa mesma universidade. As teorias de Hegel foram estudadas por Marx, que mais tarde as adaptou para defender suas próprias idéias. Foi o que ocorreu quando Marx criou o conceito de materialismo dialético, por exemplo, no qual ele discorda de Hegel e afirma que o que está na gênese do movimento histórico que constitui o mundo é o material, e não as idéias – como acreditava o professor.
Em 1843, Karl Marx casou-se com Janny Von Westphalen e mudou-se para Paris. Foi nesta cidade que acabou conhecendo, no ano seguinte, Friedrich Engels, com que manteve uma forte amizade até o fim de sua vida. Os dois escreveram em parceria o Manifesto do Partido Comunista, uma das obras de maior influência política do mundo. O Manifesto discorre sobre os problemas existentes no sistema capitalista e sugere uma revolução socialista através da tomada do poder pelo proletariado – a chamada luta de classes. aqui as relações mudaram para um poder jurídico/mdiático.