Perguntou-lhe Pilatos [a Jesus Cristo]:
“O que é a verdade?” Tendo dito isto,
voltou aos judeus e lhes disse:
“Eu não acho nele crime algum”. (João 18:38)

* * * * *

Nos debates que venho participando para o lançamento do livro Jornalismo em tempos de pós-verdade – para o qual escrevi um dos artigos -, diferentemente de alguns colegas de profissão, tenho expressado visão pessimista sobre a possibilidade de se vencer as chamadas “fake news”.

Nessas conversas, começo argumentando que o termo “fake news”, de tão banalizado, perdeu o sentido. Tanto pode ser uma informação falsa, como uma notícia da qual alguém não goste. Vide como essas duas palavras são frequentemente repetidas por políticos descontentes com notícias incômodas.

Por algum tempo, preferi usar “notícia fraudulenta”, como sugere o professor Carlos Eduardo Lins da Silva. Depois, dei-me conta de que uma notícia tem de ser verdadeira, por definição. Assim, “notícia fraudulenta” é uma contradição em si. Talvez o melhor seja melhor simplificar para “mentira” e “boato” publicações que agridam a verdade.

Sobre as agências de checagem, que repõem a verdade sobre as mentiras circulantes, o trabalho delas equivale a um cachorro correndo atrás do rabo. A cada falsidade que elas corrigem, 10 outras mentiras já surgiram na praça. E, o mais importante, quem acredita na mentira, desacredita em quem lhe tira a máscara. Logo, a reposição da verdade, entrará também na categoria de “fake news”.

Em consequência disso, eu digo, caminhamos na direção de uma sociedade em que será difícil separar a mentira da verdade. Assim, cada pessoa ou grupo criará a sua própria realidade, a sua bolha, desconectada do mundo real. Serão vários mundos paralelos, em dimensões diferentes, com poucos ou nenhum ponto de contato. A comunicação se tornará impossível. A incomunicabilidade será total, a não ser com o próprio avatar, os habitantes da mesma bolha. Será como retroagir a uma sociedade tribal. (Creio mesmo que já estamos experimentando tal situação, e como se observa, não é uma coisa bonita de se ver.)

Até agora levantava esses assuntos por observação empírica. Mas uma pesquisa mostrou que “checagens e correções não abalam a crença das pessoas em notícias falsas no período eleitoral”, conforme divulgou o jornal Folha de S. Paulo (22/10/2018). O estudo foi feito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e as universidades Emory e da Carolina do Norte (EUA).

Segundo o jornal, a primeira pesquisa foi realizada em maio, com notícias falsas sobre o PT, e mostrou que, entre aqueles que acreditam nas informações inverídicas, a correção, mesmo vinda de veículo profissional de imprensa, teve pouco impacto. O mesmo experimento, repetido em outubro, mostrou que desmentir foi inócuo.

Para Felipe Nunes, pesquisador da UFMG, “as pessoas têm tanta certeza e convicção que dizer a elas que é mentira não faz a menor diferença”. Assim, ele diz o esforço para combater as notícias falsas entre os “convertidos” é inútil. Para o professor, esse resultado foi “surpreendente”.

Na boa, o resultado, para mim, confirma uma suspeita que eu já desenvolvia. Para fanáticos, de qualquer espécie, a verdade ou a realidade, é apenas detalhe, ou nem isso.

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