Se alguém ainda tinha ilusão de que o propósito da “República de Curitiba” era unicamente fazer justiça, como apregoavam seus integrantes, essa impressão deve ter-se desvanecido – pelo menos para alguém com um mínimo de argúcia – depois das últimas mensagens divulgadas pelo The Intercept Brasil e pela Folha de S. Paulo.

O próprio jornal com a prudência que tem caracterizado suas reportagens sobre o assunto, escreve:

“Conversas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gravadas pela Polícia Federal em 2016 e mantidas em sigilo desde então enfraquecem a tese usada pelo hoje ministro Sergio Moro para justificar a decisão mais controversa que ele tomou como juiz à frente da Lava Jato”.

Recorde-se que em março de 2016, Moro tornou público um diálogo, gravado irregularmente, em que a então presidente Dilma Rousseff conversou como Lula sobre a nomeação dele como ministro da Casa Civil. Como se sabe Dilma disse que encaminharia o termo de posse de Lula para que ele pudesse usá-lo “em caso de necessidade”.

A divulgação da conversa provocou mobilizações no Brasil inteiro, sob o argumento de que a nomeação tinha o objetivo de livrar Lula da cadeia, pois ele ganharia foro privilegiado. Isso levou o ministro Gilmar Mendes a dar uma liminar impedindo a posse do ex-presidente.

No entanto, Moro divulgou apenas parte dos diálogos, os trechos que supostamente incriminavam Lula. O teor total das gravações mostra que Lula relutava em aceitar o cargo, e só o fez após insistência de aliados. Segundo os diálogos agora divulgados – e que foram mantidos em segredo pela Política Federal e Procurador – o objetivo principal de Lula era buscar a governabilidade e evitar o impeachment da presidente Dilma Rousseff, ou seja, propósitos políticos legítimos e legais. Para isso, Lula dispunha-se a conversar com o então vice-presidente Michel Temer e com o, na época, presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.

O então juiz Sergio Moro e procuradores da Lava Jato usaram parte das informações de que dispunham para manipular a opinião pública contra Lula, contribuindo para levar a presidente Dilma ao impeachment. Agiram como um partido político desqualificado e não como representantes de instituições de Estado: o Ministério Público e a Justiça. Portanto, se os diálogos completos houvessem sido divulgados, a história recente poderia ter sido diferente.

Além disso, alguns procuradores comportaram-se como seres humanos desprezíveis, como foi o caso de tripudiar sobre a morte de parentes do ex-presidente Lula e, agora, tratando- de “9”, referência à sua deficiência física, como foi o caso de Deltan Dallagnol. A desculpa de que eram “conversas particulares” não absolve quem age com deficiência moral, seja em público ou em privado.

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