Amargando seis anos seguidos de seca, o açude Castanhão registrava em 2 de outubro volume próximo de 3,3% da capacidade total: um dos mais baixos níveis desde a criação do reservatório, em 2002. No mesmo dia, deputados estaduais do Ceará debatiam de forma acalorada problemas até pouco tempo atrás desconhecidos no Estado: “doutrinação socialista” e a “ideologia de gênero” em escolas.

“Isso é mais importante que qualquer matéria”, disse o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP), convidado do evento. O destaque a temas morais não foi exclusivo daquela data: Em 2017, temas de gênero e o “Escola Sem Partido” figuraram ao lado de assuntos como violência e saúde entre os mais comentados na Assembleia.

A informação tem base em levantamento do O POVO em registros da Casa sobre discursos de deputados em 2017. Ao todo, discussões sobre o debate de gênero para crianças – classificada como “ideologia de gênero” por grupos críticos – mobilizou pelo menos 48 pronunciamentos na Casa. O número supera discursos sobre a seca, 46, e até problemas mais estruturais da educação, 33.

Pauta conservadora

Em sua grande maioria, discursos sobre o tema – até ano passado raramente citado na Casa – partiram do lado contrário ao ensino. Outros temas mais próximos de setores conservadores, como a defesa do armamento de civis, a proibição do aborto inclusive em casos de estupro e até restrições para imigrantes também cresceram, registrando quase 60 menções.

“Isso é extremamente natural e democrático. O Brasil é um país de maioria conservadora, as famílias são baseadas nos valores cristãos. Então o parlamento acaba sendo uma caixa de ressonância do que o povo sente, do que ele quer ver os deputados defendendo”, diz Ely Aguiar (PSDC). “O próprio eleitor pressiona, a gente sente essa pauta”, corrobora Mário Hélio (PDT).

Fernando Hugo (PP) destaca ainda que o debate entre os temas se acirrou por conta de uma reação da população à “imposição” de posturas não conservadoras que teria ocorrido durante governos do PT. “O Brasil vinha de um processo intenso de esquerdização”, diz.

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Carlos Mazza

Repórter do núcleo de Conjuntura do O POVO. Jornalismo de dados, reportagens investigativas, bastidores da política cearense. carlosmazza@opovo.com.br / Twitter: @ccmazza

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