No Ceará também

Se dança o mambo bem

Pois no seu ritmo tem

Qualquer coisa do nosso baião

O  mambo do Ceará

Tem bossa especiá

Nem o Perez Prado

Consegue acertá

Esse tá de “uhhh”

A gente num faz não

A gente prefere a nossa invenção 

“Vige”

 img_prod5c78964231021231[Trecho da música “Mambo do Ceará”. Autoria: Catulo de Paula – Roberto Silveira. Interpretação: Trio Nagô]

 

O Trio Nagô foi um grupo musical cearense que fez muito sucesso nos anos cinquenta, e quase desconhecido das gerações atuais. O Trio começou a se estruturar em 1948 quando Mário Alves de Almeida e Epaminondas de Souza, que já cantavam na Ceará Rádio Club, conheceram Evaldo Gouveia.  

Inicialmente eles se chamaram Trio Cearense. Depois, adotaram a denominação de Trio Iracema. Por fim,  acatando sugestão de Eduardo Campos, à época Diretor da Ceará Rádio Club, passaram a se chamar Trio Nagô, nome com o qual se consagrariam e atravessariam fronteiras, granjeando sucesso tanto em países da América Latina quanto da Europa. Em 1954, o Trio foi agraciado com o Prêmio Roquete Pinto “O Melhor Conjunto Vocal”.

O disco “Trio Nagô – Prece ao Vento”, lançado pelo selo Revivendo, é uma coletânea organizada a partir de músicas originalmente gravadas em LPs e 78 rpm. Algumas canções trazem a marca da conhecida molecagem e bom humor característicso do povo cerense, como o “Mambo do Ceará”, em que, ao invés do tradicional “Hum!”,exclamado no final das canções, se ouve um animado “Vige!”

“Acorrege a Prenúncia” é outra gravação eivada de humor e molecagem. A propósito, informa o encarte que acompanha o CD: “O Trio canta com graça como se fosse um pouco da história de quem veio do Ceará para a Capital da República, trazendo o violão do Evaldo, o atabaque do Epaminondas, a voz do Mário e, claro, muita categoria sem abandonar a simplicidade do cearense”. Os versos finais da canção dizem: “Num tivemo nas escola/ Pra aprendê prenunciá/ Bem que meu pai me dizia:/ Meu fio/ Acorrege a prenúncia”.

A propósito da música “A noite e a prece”, composta por Evaldo Gouveia e Almeida Rêgo, também incluída no CD, informa o texto do encarte: “Conta Evaldo Gouveia que costumava visitar o Almeida Rêgo, seu parceiro, sempre à tardinha. Num desses dias, após algumas investidas para nova composição, foi até a janela do apartamento e mal olhou para a frente, viu o sol se pondo. Virou-se e disse: ‘Almeida, olha o sol no horizonte morrendo, entre nuvens vermelhas… A frase bastou para pegar novamente o violão e o Almeida lápis e papel'”. Além do sol se pondo, porém, a composição teve ainda  uma outra motivação, conforme o texto citado: “Na verdade, diz Evaldo, aquele sol morrendo no horizonte, lembrando a Ave Maria, traduzia a saudade de um grande amor, e solta um sorriso”.

Para que o leitor possa apreciar um pouco a beleza da canção, cito a primeira estrofe de “A noite e a prece”: “O sol/ No horizonte morrendo/ Entre nuvens vermelhas/ Anuncia que a noite/ Está pra chegar/ E eu de mãos postas, rezando,/ Peço a Deus numa prece/ Que a morena que eu quero/ Não se esqueça de mim”. 

Por fim, eu não poderia deixar de mencionar a música que abre o disco, uma das mais belas do nosso cancionerio, tida como um dos sucessos mais populares do Trio Nagô, cuja execução se tornaria obrigatória em suas apresentações. Trata-se de “Prece ao vento”, composição de Alcyr Peres Vermelho e Fernado Luiz, cujos primeiros versos lembramos aqui: “Vento que embalança as paia do coqueiro/ Vento que encrespa as água do mar/ Vento que assanha os cabelo da morena/ Me traz notícia de lá”.

“Trio Nagô – Prece ao Vento”, é um disco recomendado tanto às novas quanto às mais antigas gerações: às primeiras, recomenda-se como oportunidade de conhecer um dos momentos áureos de nossa música; às segundas, como uma oportunidade de rememorar bons e saudosos momentos da música de qualidade.

About the Author

Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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