paulus_meditacoes_taroQuando alguém medita sobre os Arcanos do Tarô, as camadas profundas e íntimas de sua alma se tornam ativas e dão seus frutos. É pois necessária a noite da qual fala são João da Cruz, na qual a alma se mantém em segredo e na qual deve atirar-se toda vez que medita sobre os Arcanos do Tarô. É trabalho que deve ser realizado na solidão e que convém aos solitários.

Por um autor que quis manter-se no anonimato.

 [Meditações sobre os 22 Arcanos Maiores do Tarô/ por um autor que quis manter-se no anonimato; prefácio de Robert Spaemann; apresentação de Hans Urs von Balthasar; (tradução Benôni Lemos).- São Paulo: Paulus, 1989, p. 21. – (Coleção Amor e Psique)

 

O livro de que falarei aqui tem uma característica bastante peculiar: nem na sua capa, nem tampouco nas páginas seguintes, se encontrará dados que identifiquem o autor. Ou seja, não é que seja um livro sem autor, mas um livro cujo autor preferiu, por motivos que só ele sabe, se manter no anonimato. Na ficha catalográfica encontra-se a curiosa informação:  por um autor que quis manter-se no anonimato.

Na Apresentação, afirma Hans Urs von Balthasar (1905-1988), um dos mais conhecidos teólogos cristãos do século XX: Um pensador e orante cristão, cuja pureza força à admiração, apresenta-se diante de nós, inspirando-se nas ciências cabalísticas e em alguns elementos da alquimia e da astrologia, símbolos do hermetismo cristão em seus diferentes níveis – mística, gnose e magia – símbolos esses reunidos nos chamados vinte e dois grandes arcanos do jogo de tarô, e, por suas meditações, procura reconduzir à sabedoria mais profunda, porque universal, do mistério católico (p. 11).  A propósito do autor, informa: O autor fez questão de conservar-se no anonimato a fim de permitir que sua obra fale plenamente por si mesma e de evitar qualquer interferência de elementos pessoais. São razões que devemos respeitar (p.17).

Na verdade, adotando um estilo bastante hermético, como convém a quem aborda o assunto a que  se propõe o livro, o autor se dá a conhecer ao leitor nas seguintes palavras: Essas meditações sobre os arcanos maiores do tarô se apresentam na forma de cartas dirigidas ao amigo desconhecido. O amigo desconhecido é cada um daqueles que as ler; depois de as meditar, ele saberá com certeza o que é o hermetismo cristão. Verá também que, através dessas cartas, o autor diz mais sobre si mesmo do que poderia fazê-lo de outra forma e, graças a elas, ele o conhecerá melhor do que por qualquer outra fonte (p. 18).

No final desse texto introdutório, o autor se dirige assim ao pretenso leitor, a quem tratará do começo ao fim do livro por Caro Amigo Desconhecido: Do além-túmulo, teu amigo te saúda, caro amigo desconhecido (p. 18). Certa vez li em algum lugar que o autor desse livro seria um Cardeal que, por esse motivo, preferiu manter o anonimato quanto à sua autoria. Não duvido.

O tarô é um baralho constituído por 78 cartas, divididas em Arcanos Maiores, com 22, e Arcanos Menores, com 56. As cartas dos Arcanos Maiores são portadoras de um denso simbolismo, permitindo inúmeras formas de interpretação. O tarô de Marselha, provavelmente o mais conhecido e mais usado pelos tarólogos, tem um simbolismo acentuadamente cristão.

No caso do livro aqui tratado, o autor se propõe uma interpretação dos 22 Arcanos Maiores sob a perspectiva do Mistério da Encarnação de Cristo, o que faz com paixão e grande erudição. Ao longo do texto, o autor se vale de citações tomadas de empréstimo à Bíblia, a teólogos, a psicólogos, a místicos, a esoteristas, a hermetistas, a filósofos e autores de obras literárias para sustentar suas teses. É, portanto, um livro escrito por alguém a quem se pode, seguramente, atribuir um saber enciclopédico. É, igualmente, um livro cuja leitura pressupõe, da parte de quem o vai ler, um bom conhecimento dos Arcanos Maiores do Tarô.

Para mim, que há muitos anos uso o tarô como um grande recurso para o autoconhecimento, e tendo em vista que me filio religiosamente à tradição cristã, a leitura deste Meditações sobre os 22 Arcanos Maiores do Tarô tem não só me proporcionado imenso prazer quanto uma perspectiva diferente de interpretação do Oráculo.

Adquiri o hábito de, quando recorro ao tarô, examinar as diferentes representações pictóricas do mesmo Arcano, pois tenho uma coleção de 15 tarôs. Depois de ponderar demoradamente sobre o desenho dos Arcanos, passo ao cotejamento de textos de diferentes autores sobre o assunto. Para concluir, faço a minha síntese do Arcano em apreço.  Quero finalizar  com algumas palavras do próprio desconhecido autor sobre o valor do estudo dos Arcanos Maiores do Tarô:

Ora, são os Arcanos que nos estimulam e dirigem na arte de aprender. Nesse sentido, os Arcanos Maiores do Tarô são uma escola completa e inestimável de meditação, de estudos e de esforços espirituais – uma introdução à magistral arte de aprender (p. 23).

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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