yogananda

Um discípulo magnetiza-se espiritualmente pelo respeitoso contato com o mestre; gera-se uma corrente sutil. Os mecanismos de hábitos indesejáveis, no cérebro do devoto, são muitas vezes cauterizados; as cissuras de suas tendências mundanas são beneficamente alteradas. Momentaneamente, pelo menos, ele pode surpreender o levantamento dos véus secretos de máya e ter um vislumbre da verdadeira beatitude. Meu corpo inteiro respondia com um arrebatamento de liberação sempre que me ajoelhava, no estilo indiano, diante de meu Mestre.

Paramahansa Yogananda

[Yogananda, Paramahansa. Autobiografia de um iogue. Tradução de Adelaide Petters Lessa. São Paulo: Summus, 1981, p. 120.]

Em 1986 o professor Ricardo Lincoln, do curso de psicologia da UFC, convidou alguns alunos e amigos para formar um pequeno grupo para praticar meditação. Os encontros aconteciam no apartamento de sua mãe, Dona Inaura, aos sábados a partir das dezessete horas. Naquela época serviam de inspiração ao grupo os ensinamentos do Mestre indiano Paramahansa Yogananda, expostos no seu livro Autobiografia de Um Iogue. Adotou-se o hábito de ler, antes ou depois da meditação, algum trecho do livro e discuti-lo em grupo.

Como algumas pessoas do grupo estivessem interessadas em adquirir um exemplar do livro, Ricardo ficou encarregado de falar com o Sr. Augusto, que vendia livros num quiosque no Departamento de Psicologia da UFC, para saber se ele dispunha de alguns exemplares. No sábado seguinte, antes de iniciar a meditação, falou que o livreiro dispunha de apenas um exemplar. Como houvesse mais de um interessado, Ricardo decidiu que faria um sorteio para ver com quem ficaria o livro. Pois bem, fui eu o sorteado.

Essa foi uma das raras vezes na vida em que fui agraciado com um prêmio em uma rifa. Mas, que prêmio! Ao tomar em minhas mãos o livro, não fazia a menor idéia do quanto ele modificaria minha vida. Posso dizer sem medo de incorrer em equívoco que nenhum livro, dentre os inúmeros que tenho lido ao longo de minha existência, nem, tampouco, qualquer outro Mestre, provocou na minha vida mudanças de tamanha envergadura quanto as que foram provocadas pelo contato com os ensinamentos de Paramahansa Yogananda quando da leitura de Autobiografia de um iogue.

A partir daquela data, li a Autobiografia quase diariamente durante os dez anos seguintes. Os anos que vão de 1986 a 1996 assinalaram a década de mais profunda e duradoura mudança experimentada por mim, e isso especialmente graças ao contato diuturno com os ensinamentos de Yoganandají. Desenvolvi o hábito de, todas as manhãs, iniciar o dia com uma leitura da Autobiografia, seguida de uma meditação de vinte e um minutos.

Aprendi a amar tanto Paramahansa Yogananda quanto os três outros Mestres que o antecederam na sucessão de gurus e discípulos: Mahávatár Bábají, Láhiri Mahásaya e Sri Yuktéswar. Recortei do livro as fotografias de Yoganandají e Bábají e mandei emoldurá-las, passando a meditar todos os dias diante delas. Durante a meditação, assumi sempre a postura de que estava, de fato, diante dos dois Mestres, e não apenas de suas fotografias.

Nessa ocasião, começou a despertar em mim uma grande nostalgia pelo Himalaia. Era como se a cordilheira fosse algo assim como uma antiga residência, da qual eu sentia intensa saudade. Recortei, também da Autobiografia, um mapa da Índia e, depois de emoldurá-lo, afixei na parede bem defronte ao local das minhas meditações. Durante minhas meditações, ao mesmo tempo em que repetia mantras ou os nomes de Yoganandají e Bábají, fitava fixamente, ora as fotografias dos dois Mestres, ora o mapa da Índia, implorando aos benevolentes gurus que, um dia, me concedessem a graça de ir ao Himalaia.

Dez anos depois, em 1996, o meu pedido foi maravilhosa e surpreendentemente atendido. Fiz, então, uma peregrinação à Índia e ao Nepal, quando tive oportunidade de passar alguns dias no Himalaia, pisando, enfim, o solo abençoado por tantos e tão iluminados Mestres. Atribuí a Paramahansa Yogananda essa graça especialíssima.

Ao longo deste mês de setembro dedicarei as terças-feiras ao relato dos meus encontros com a sabedoria e ensinamentos de Paramahansa Yogananda, pois o que tenho para falar é muito para ser resumido em um ou dois textos.

About the Author

Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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