O toque das grandes aventuras seria forjado por ele mesmo. Corção, com a sua aguda sensibilidade, soube tirar do cotidiano ordinário percepções extraordinárias.

Marta Braga

[Braga, Marta. Lições de Gustavo Corção. – São Paulo: Quadrante, 2010, p. 11. – (Coleção Vértice; 71)]

Gustavo Corção Braga nasceu a dezessete de dezembro de 1896, no Rocha, subúrbio do Rio de Janeiro, segundo filho de Francisco Braga e de Gracieta Amélia Corção (p. 10). A leitura dessas palavras no capítulo 1 do livro Lições de Gustavo Corção, de Marta Braga, fizeram o meu coração pulsar um pouco mais acelerado. O fato é que, ao ler a informação, me dei conta de que aquele dia em que eu iniciava a leitura da biografia de Corção era, também, dezessete de dezembro. Sem que eu o soubesse, escolhera para me iniciar na vida e obra de Gustavo Corção exatamente o dia de seu aniversário de nascimento. Tendo em vista a expectativa com que eu aguardara a leitura daquele livro, aliado ao valor que atribuo às coincidências, digo, sincronicidades, nada poderia me deixar mais eufórico naquela ocasião. Na momento em que me dei conta do fato, interrompi a leitura para fazer o registro no Diário do Caminho.

Eu nunca havia ouvido falar de Gustavo Corção. Então recebo um e-mail do amigo Pimentel Júnior no qual ele transcrevia uma citação desse autor, dizendo que ma estava enviando porque sua leitura o fizera lembrar de mim. À leitura da citação seguiu-se a exclamação: “Preciso conhecer Gustavo Corção!” O trecho fora tirado do livro Lições de abismo. O título, por si só, já constituíra um grande motivador para que me interessasse por conhecer o autor. No mesmo dia eu ligava para as livrarias locais à procura do livro. Como não o encontrasse, resolvi encomendá-lo. Antes, porém, que a encomenda chegasse, descobri que em 2010 havia sido publicada uma biografia do autor. Resolvi fazer sua leitura antes de Lições de abismo. Como também não a encontrasse, fiz a encomenda na livraria. Uma semana depois de receber Lições de abismo, chegou Lições de Gustavo Corção.

Iniciada a leitura – depois da euforia experimentada logo às primeiras páginas, devido à sincronicidade relatada acima -, fui descobrindo um autor que logo me despertaria grande interesse. No primeiro capítulo, ao tratar da infância de Corção, escreve Marta Braga:

Esses anos felizes foram certamente a origem de outra qualidade fundamental da personalidade corçoniana: a crença na simplicidade do homem comum e no bom-senso. A sua insistência posterior em afirmar que são os fenômenos mais simples e correntes os que guardam as maiores verdades sobre a vida humana é coerente com a sua valorização dessa época e dessa gente (p. 15).

Essa capacidade de encontrar o sentido maior nos fatos menores do cotidiano, me fascina. Nas páginas seguintes, porém, eu encontraria outras características que aguçariam a minha curiosidade, como quando a autora fala da estratégia de busca da verdade adotada por Corção:

O desprezo pelos esquemas prontos e pelos caminhos já traçados, pelas conveniências meramente sociais e culturais, tornou-se algo medular nele” escreve Marta Braga na página 17. E, mais adiante: Livros, observações, sobretudo a experiência prática baseada num programa livre e próprio, esses eram os seus métodos. Métodos que o fariam desconfiar sempre dos profissionais bem instalados, protegidos pelas seguranças políticas, cujas pesquisas não eram, como as dele, uma aventura arriscada. A sua informalidade de aprendizagem daria sempre frutos compensadores (p. 18).

Essa busca informal pela verdade, seguindo um caminho tortuoso e cheio de desvios e bifurcações, mas, por isso mesmo, sempre emocionante, me atrai. Uma busca que se dá de forma mais ou menos intuitiva, feita em livros, no encontro com as pessoas, nos acontecimentos, nas coincidências, em tudo o que aparece pela frente, como se se montasse um grande quebra-cabeça cujas peças estão dispersas em diferentes locais e circunstâncias.

É disso que fala Marta Braga na sua providencial biografia de Gustavo Corção. O livro é produto de uma tese doutoral defendida por ela na Espanha. A autora nasceu em 1972 no Cosme Velho, bairro da cidade do Rio de Janeiro. Formada em História e Geografia, é Doutora em História Contemporânea pela Universidade de Navarra (Espanha), além de ter uma especialização em História do pensamento católico no Brasil do século XX.

Como a exploração da vida e obra de Gustavo Corção é o meu projeto para os primeiros meses de 2012, retornarei ainda algumas vezes a este pensador brasileiro em outros textos aqui no Sincronicidade, ocasião em que falarei dele com mais detalhes. Para concluir, deixo uma citação de Lições de Gustavo Corção, uma síntese da vida e da obra do autor de Lições de abismo:

Realista até a crueza como Papini, terno como León Bloy, implacável como Louis Veuillot, e, além disso, conhecedor de todos eles; admirador de Frederico Ozanan, devoto de Santa Catarina de Sena, de São Tomás More, de São Bento e especialmente de São Vicente de Paulo; entusiasmado pelo cristianismo vivo de Chesterton e pela seriedade comprometida de Maritain, frequentador assíduo dos sacramentos, conferencista brilhante, crente na participação intelectual, política e social, a figura de Corção, depois da sua conversão, fez-se extremamente grande e respeitada. Nos meios urbanos e intelectuais, pouca gente o desconhecia e a reação a ele era de rejeição ou adesão, nunca de indiferença (p. 49).

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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