aprendemosVi uma cena ontem em que a mãe dizia o seguinte para sua filha: “cuidado com o bicho-papão, ele pode te pegar e fazer com você a mesma coisa que fez com aquela menininha linda, a Alanis. Lembra o que a mamãe disse, de não falar com ninguém quando a mamãe ou papai não estiverem por perto? Ali tem muita criança, por isso você não pode ir”.

Fiquei observando a cena primeiramente porque a criança estava chorando, quer dizer, berrando,  já que a mãe não deixava ela brincar em um escorregador próximo de uma sorveteria onde estávamos. Depois me chamou a atenção as palavras da mãe. Claro que por conta dos últimos acontecimentos os pais estão inseguros, com medo, ansiosos, acho até que sem saber como agir diante de tanta crueldade cometida por adultos contra crianças.

No entanto, fiquei me perguntando como aquela família apresentou o “caso Alanis” para aquela criança e quais conselhos ou respostas estaria dando a partir daquele momento. A criança deveria ter entre sete e dez anos.  Depois que a mãe falou enfaticamente “aquela menininha linda, a Alanis”, a criança parou de chorar por alguns segundos, como tentando relembrar alguma coisa e depois continuou o choro.

Até que ponto aquelas palavras fizeram sentido? O que significava “aquela menininha linda, a Alanis” para aquela criança que queria brincar com outras crianças e a mãe não deixava? Será que existia alguma diferença entre adultos, crianças e bicho-papão? O que ela faria com aquela informação? Era educativo?Errado? Certo?

Assim que cheguei em casa fui conversar com meu pai sobre a minha reação enquanto criança quando eles me davam algum conselho ou reprimiam alguma ação. Minha mãe disse que eu sempre desobedecia! Queria saber o por que até eles me darem uma explicação “lógica”, quer dizer, algo que fizesse sentido para mim dentro do meu universo e do momento vivido.

Encontrei um artigo sobre o assunto e queria compartilhar com vocês. Fala sobre regras e aprendizagem. Espero que ajude a conduzir melhor as ações dos pais e que vocês pensem sempre como as crianças irão reagir diante dos fatos.

Boa leitura! Enviem os comentários de vocês sobre o tema.

                                                                                                       Vida regrada

Existem duas maneiras de se aprender: seguindo regras dadas por outras pessoas (inclusive as escritas nos livros) ou experimentando.

As regras ajudam muito os pais e professores. Através delas é possível ensinar que algumas coisas não são aceitas socialmente ou que são perigosas sem que uma experiência ruim ou que ofereça riscos precise ser vivida. Elas permitem, por exemplo, que não seja preciso que uma criança coloque a mão numa panela quente para aprender que pode se queimar.

Quando os pais dão regras ou conselhos aos filhos e eles são confirmados na experiência deles, os filhos tendem a seguir as outras regras que os pais lhes dão. Por exemplo, instruí meu filho a não comer demais. Um amigo dele comeu demais e passou mal. As coisas que aconteceram confirmaram o que eu disse a ele. Da próxima vez que eu lhe der algum conselho, ele provavelmente seguirá.

No entanto, se eu digo ao meu filho que ele não pode se afastar de casa quando estiver brincando na rua porque o bicho-papão pode passar e levá-lo embora, é muito pouco provável que a experiência dele venha a confirmar a regra que eu passei.

cerebros

Um dia ou outro, ele vai brincar mais longe de casa e verá que não passará nenhum bicho-papão para levá-lo (sem contar com a possibilidade de ridicularização por parte dos colegas, o que já seria uma punição social ou um indício de que a regra passada foi falsa).

Nessa situação, é muito pouco provável que meu filho venha a seguir o próximo conselho que eu lhe der. E talvez ele possa começar a duvidar de coisas que eu diga de maneira geral (como “comer verduras faz bem”).

Regras que são bem explicadas e que têm a ver com a realidade da criança têm grande probabilidade de serem seguidas. Regras passadas sem explicação e sem relação com a realidade são armadilhas que os pais fazem para eles mesmos.

As pessoas que sempre seguem regras ou que nunca as testam têm menos probabilidade de desenvolver o lado mais sensível ou experimental. É como a pessoa que vê, pelo vidro da janela que está nublado e se agasalha bem, porque aprendeu que em dias nublados faz frio e devemos nos agasalhar. Uma pessoa que experimenta mais, abriria a janela ou sairia para sentir o quanto está frio antes de se agasalhar.

É interessante que, sempre que possível, os pais incentivem esse tipo de aprendizagem através do contato com o mundo, pois é nesses contatos ou nas experiências reais, que acontece a verdadeira aprendizagem, mesmo quando ela começa com uma regra.

Luciana Rosa Machado
lu_rosa@bol.com.br.

Fonte: Bragança Jornal Diário, 2004

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Valeska Andrade

Formada em História pela Universidade Federal do Ceará e em Pedagogia pela Universidade Estadual do Ceará. Especialista em Cultura Brasileira e Arte Educação. Coordenou o Programa O POVO na Educação até agosto de 2010. Pesquisadora e orientadora do POVO na Educação de 2003 a 2010, desenvolveu, entre outras atividades, a leitura crítica e a educomunicação nas salas de aula, utilizando o jornal como principal ferramenta pedagógica. Atualmente, é professora de história da rede estadual de ensino. Pesquisadora do Maracatu Cearense e das práticas educacionais inovadoras. Sempre curiosa!!!

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