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As diferenças, por serem tão exatas e tão características, tornam-se molas propulsoras para os dias longínquos e adversos que os seres humanos tenham a passar. Ele, um menino querendo ser homem. Ela, uma mulher sendo menina. Ambos se completam e ao mesmo tempo, separam-se. Separam-se pela individualidade dele, pela perseverança de um mundo melhor dela, pela rigidez dele, pela calmaria dela, ultrapassando todos os obstáculos característicos, ambos são caricatos de suas próprias realidades. Ele exaurido pelo deslumbre da juventude e de uma certa boêmia. Ela, exausta de um mundo claustrofóbico e cheio de manias, mas é preciso viver, conviver, tolerar e se possível, amar.

 

Ele gosta de cappuccino com açúcar e com um pouco de chocolate. Ela prefere um café amargo, sem açúcar e muito menos com adoçante. Ela gosta de bordar. Ele curte conversar. Ela prefere vinho tinto, ele prefere tequila e vinho seco, cor de sangue, cor de sangue, cor de sangue, desculpe repetir três vezes, mas é preciso, pois tenho que frisar isso muito bem, ele gosta de vermelho, cor de sangue, ela fica com o azul bebê do céu.

 

Ele quer ser fino trato, ela prefere a modéstia e a simplicidade. Ele busca o perfeito, ela apenas quer achar o xis da questão. Já ele, teimoso, quer saber a equação inteira, ela porém é decisiva e objetiva, sabe onde está a resposta. Ele gosta de tragar, ela gosta de beijar e ousar. Ele curte rock, ela curte ser eclética. Ambos, fumam, fumam sonhos, sonhos individuais, misteriosos e mentirosos.

 

Ela gosta do cd velho de Nara Leão guardado na estante da sala vermelha. Ele prefere escutar o seu disco dos Beatles e ficar lendo Simone de Beauvoir, já ela se dá bem com Sartre. Ele prefere literatura brasileira, ela adora os clássicos filosóficos franceses.Ela fala inglês, ele titubeia no francês, pardon. Ele é impulsivo, ela, lúcida demais. Ela é alucinante, ele alucinado.

 

Ele gosta de comer uvas roxas sem semente, ela se delicia com as mangas e bananas que compra na feirinha perto de sua casa. Ela ama política, ele por acasos do destino é metido em economia e cultura. Ele se dá bem com prazos, já ela, xiii, prazos são raros, pratos raros e rasos.

 

Ela é uma flor de laranjeira, ele, um cipó forte. Ele gosta de perfumes doces e fortes e inebriantes, ela fica com os parfums clássicos.

 

Ela fala pelos cotovelos, não por querer, mas sim de ser uma das suas principais características, que ele, reservado como sempre, briga excessivamente. Ele quer mudanças nela, mudanças drásticas, mudanças de personalidade, de originalidade, ela quer nele, apenas adaptações e amadurecimento.

 

Ele diz que amadurecimento vem com o tempo, vem com as experiências e relações etc., ela conta que amadurecer deve ser um acordo vitalício de si para si mesmo.

 

Ela gasta conversas intermináveis com “papai”, ele odeia falar muito tempo ao telefone.Ele é cético em tudo, tem que ver para crer. Ela é a inocência em pessoa.

 

Poderia ficar falando aqui as milhares de diferenças entre essas duas almas, essas duas pessoas, esses dois corações, essas duas mentes brilhantes e perdidas e saturadas e enfim, mas preciso terminar de contar este conto, pois se não termino, fico aqui até o dia clarear, falando sobre a diferença de um e de outro, são inúmeras as diferenças, as contradições, os contrastes ganham o mundo.

 

Apesar dos pesares, há uma admiração compartilhada e recíproca entre eles. São iguais no agir, no pensar, no falar, são iguais por serem diferentes, por terem diferenças tão descabíveis que acabam se identificando. Ele com seu coração sitiado de dúvidas e ela com o pulsante livre feito uma pomba branca.

 

Texto: Eduardo Sousa || Imagem: Internet