Olá, turma! Tudo bem?

É assim que Lucas Feuerschütte, o Luba, cumprimenta o público que o acompanha no YouTube. Com mais de 2 milhões de inscritos, o youtuber divide o dia a dia com os seguidores por meio dos vídeos e das redes sociais. Há momentos em que compartilha histórias que, de alguma forma, precisam ser discutidas. Ainda mais depois que ele passou a tratar abertamente da própria sexualidade. Dessa forma, ele gravou o vídeo “batom vermelho incomoda?“.

Em pouco mais de cinco minutos, o vlogger mais famoso de Santa Catarina falou sobre o garoto de 16 anos, de Fortaleza, que gosta de usar batom vermelho na escola e foi repreendido por isso. Luba, aos plenos 25 anos, não pensou duas vezes antes de pintar os lábios de vermelho em apoio ao cearense. “Eu tô contigo, cara. Do fundo do meu coração”.

Luba YT

Imagem: Divulgação

Lucas tomou conhecimento do fato no último mês de fevereiro, por meio do Facebook. No dia 2, um dia após o jovem (que teve a identidade preservada) ser proibido pela mãe de usar o cosmético, cerca de 40 alunos do colégio em que estuda, na capital alencarina, usaram batom vermelho como forma de apoio. Estudantes de outra instituição repetiram o ato. O caso foi noticiado e discutido em uma reportagem do O POVO.

“Uma vez me chamaram de viadinho”, contou ao Repórter Entre Linhas“Eu não consigo nem imaginar o que é uma pessoa passando por isso todos os dias”. Luba falou sobre preconceito, estigmas impostos pela sociedade e discorreu a respeito da necessidade de debater temas mais complexos, como o caso do cearense, com seu público. Leia a entrevista na íntegra.

Por que foi importante para você contar essa história para a turma?

Luba: Acho que foi importante contar essa história pra turma porque muita gente olha para mim como uma escapatória da vida real, sabe? O meu objetivo no YouTube sempre foi tirar as pessoas de um mundo tedioso, chato e dramático e as pessoas olham pra mim como uma saída desse lugar, até porque sempre foi isso que eu sempre ofereci. E quando as pessoas veem alguém reprimido, eu tenho voz pra falar a favor dessas pessoas. Eu sempre falei que as pessoas podem fazer o que elas quiserem contanto que não estejam machucando ninguém. E ver alguém sendo atacado meramente porque usou batom vermelho, na minha cabeça é uma coisa que não tem cabimento. Ao mesmo tempo que eu quis mostrar apoio ao garoto, achei importante falar sobre isso para as pessoas pensarem também.

Você já falou sobre sua própria sexualidade no canal e dessa vez trouxe um debate mais complexo. Por que houve essa identificação com o caso do cearense?

Luba: Eu acho que teve uma identificação com o garoto porque eu também já fui um guri, no colégio, que as pessoas olhavam estranho. Não porque eu usava batom vermelho, mas porque eu queria ser padre. E, obviamente, todo mundo percebia que eu era gay, sabe? Eu tinha jeito e tal, e eu também não fazia muita questão de esconder. Apesar de nunca ter assumido e ter ficado com meninas, o pessoal notava, querendo ou não. Então, eles olhavam estranho. Eu entendo o que é passar por isso, talvez não na gravidade do garoto, mas eu entendo.

Assim como vários colegas dele, você usou batom vermelho como forma de apoio. Qual foi a repercussão disso com seu público?

Luba: Cara, a repercussão de ter usado batom vermelho foi muito engraçada porque as pessoas meio que não ligaram (risos). A maioria dos comentários eram tipo, “nossa, como o Luba fica melhor de batom vermelho do que eu”… Ou falavam que eu passei muito rápido e ficou certinho. A repercussão foi uma coisa esperada, “normal”, também porque eu tava falando no meu espaço, apesar de ter trazido muita gente nova para o canal. Esse vídeo teve uma certa atenção, digamos assim. A repercussão não foi muito… não foi muito estranha. Eu acho que as pessoas… como é que eu posso dizer? Não se surpreenderam de eu ter feito algo assim. Acho que é isso. Acho que elas acharam ok, normal, sabe? Apesar de eu ter colocado a cara a tapa.

Luba de batom vermelho

Por que o batom vermelho ainda traz tanto estigma até para as mulheres?

Luba: Eu acho que o batom vermelho traz estigma, como tu colocou na pergunta, até para as mulheres, porque talvez a gente foi ensinado a pensar que batom vermelho é “coisa de vagabunda”. Eu já ouvi isso na minha infância, sabe? E, na verdade, eu não sei por quê. Acho que é uma coisa que foi colocada na nossa cabeça e, na minha opinião, precisa ser desaprendida. Uma cor não vai determinar tua personalidade ou dizer quem tu é.

Apoiar é uma forma de levantar bandeira?

Luba: Cara, eu não sei se apoiar é uma forma de levantar bandeira, mas… Eu acho que apoiar é apoiar. Esse negócio de levantar bandeira às vezes tem uma conotação pejorativa. As vezes é uma coisa até que as pessoas acham tal pessoa chata. Eu vejo apoio como apoio. Eu não interpreto assim, que eu levanto bandeira, apesar de falar de sexualidade porque eu falo da minha vida, né? Eu apoio os outros mas eu falo da minha vida, do que eu posso falar. Eu acho que apoio é importante simplesmente porque, na minha opinião, não é só levantar bandeira, é mostrar compaixão, mostrar o lado humano. Mostrar que a gente é capaz de se solidarizar com o outro.

E é preciso levantar bandeira?

Luba: Acho que vai ser preciso levantar bandeira até a gente abolir as bandeiras. Deixa eu ver se eu consigo me explicar melhor. Eu acho que a gente só vai ser feliz, universalmente, quando todo mundo tiver a seguinte consciência: eu não preciso nem gostar e nem desgostar do que o outro tá fazendo. Eu não preciso mostrar insatisfação, eu não preciso mostrar satisfação. Eu simplesmente preciso ser educado e respeitar. Eu não tenho nada a ver com a vida do outro, então por que que o que o outro faz com a vida dele me incomoda? Por que que a existência do que o cara faz é uma ameaça pra educação do meu filho, sabe? Acho que todo mundo precisa ter a consciência de que cada um faz o que quer, contanto que não prejudique o outro. Eu acho que isso vai acabar com as bandeiras. Em 2014, eu estava sem São Francisco, na Califórnia. As pessoas da Califórnia são muito assim, é todo mundo tão na deles que eles não estão nem aí. Eles vão pro mercado de pantufa, eles fazem o que eles querem. Na Parada Gay de São Francisco, do mesmo ano, tinha homens desfilando pelados e ao mesmo tempo na calçada da rua tinham famílias andando e prestigiando. Tinha um casal de velhinhos passeando com o neto. Acho que é uma evolução que vai demorar muito pro ser humano atingir, mas acredito que é possível. Acho que é possível a gente atingir o respeito máximo, sabe?

Você já passou por alguma situação de repressão ou preconceito parecida?

Luba: Não, a não ser coisas pequenas, tipo no colégio. Uma vez ou outra me chamaram de viadinho. Só que, eu sei que aconteceu, só que eu não consigo lembrar o dia em si, sabe? Não me marcou tanto, mas ao mesmo tempo eu não consigo nem imaginar o que é uma pessoa passando por isso todos os dias. Na verdade, a primeira vez que eu descolori o meu cabelo, um colega meu falou assim, “nossa, mas isso é coisa de viado”. Ele sabia que eu era gay. Ali eu senti uma agressão verbal. E daí que é coisa de viado? Mesmo se for coisa de viado, qual é o problema? Eu nunca fui lesado a ponto de sofrer de verdade por isso.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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