Por Alexandre Gonzaga *
Autor convidado

Torcidas enormes, estádios lotados, paixão exacerbada. Os times do Nordeste carregam há décadas o estigma do “gigante com pés de barro”. Clubes com larga tradição no futebol brasileiro e com grande massa de adeptos, mas que sofrem permanentemente com o espectro da descida de divisão e dependência financeira.

Analisando as últimas 11 edições da Série A do Campeonato Brasileiro (desde 2007), marcada pelo acesso à elite através de pontos corridos num campeonato com 20 times, destacam-se Sport-PE (8 participações), Bahia-BA (6 vezes na Série A), Vitória-BA (6 vezes na elite) e Náutico-PE (5 participações). Ceará-CE (2 vezes), Santa Cruz-PE (1 vez) e América-RN (1 vez) constituem os outros times nordestinos que disputaram a competição máxima nesse período.

Assim, em 220 participações possíveis, os clubes do Nordeste competiram na Série A apenas 29 vezes desde 2007. Não fossem os quatro times “fora da curva”, o Nordeste teria participado apenas 4 vezes no principal escalão desde 2007.

O quadro abaixo indica o total de participações dos times nordestinos nas séries A e B. Percebe-se que até na Série B as dificuldades de manutenção neste escalão são constantes e que a presença dos times do Nordeste fica aquém da expectativa das suas torcidas no que se refere à subida de divisão – em 220 participações possíveis, os nordestinos estiveram presentes 67 vezes na Série B e subiram apenas 29 vezes. A edição deste ano da segunda divisão ainda não definiu as agremiações que subirão à elite (teoricamente, faltam quatro vitórias para que Ceará consiga o acesso este ano), por isso não aparece mencionada no quadro.

O Nordeste briga por uma aproximação ao número de participações dos times do Sul em ambos os escalões. Mesmo sem contar com as presenças na Série A dos gigantes de Porto Alegre – Internacional e Grêmio – a distância em relação aos sulistas permanece acentuada – 29 presenças nordestinas contra 39 participações sulistas.

O incomparável Sudeste conta com os outros dez gigantes do futebol nacional – os mineiros Atlético e Cruzeiro, os cariocas Flamengo, Fluminense, Vasco da Gama e Botafogo, e os paulistas Corinthians, São Paulo, Santos e Palmeiras – o que inviabiliza qualquer referência em termos de disputa pelo protagonismo e assentos cativos no primeiro escalão.

O quadro seguinte apresenta o total de participações na Série A desde 2007 por Regiões.

O quadro da Série B inverte-se quando se analisa a presença dos times de ambas as regiões do Brasil. O Nordeste participou 67 vezes na divisão secundária contra 38 participações de clubes do Sul, o que poderá indicar um mau aproveitamento do “poder de fogo” disponível para realizar o assalto à elite.

Torcida determina renda de bilheteria?

Deixando os doze gigantes do futebol brasileiro fora desta análise, torna-se conveniente definir em tese quais os concorrentes dos times nordestinos e se o número de torcedores impacta diretamente (ou não) na renda de bilheteria por serem times com uma forte dimensão regional.

O Instituto Paraná Pesquisas publicou em dezembro de 2016 o último grande levantamento realizado a nível nacional com 10 mil entrevistados. O estudo aponta que o Nordeste tem seis times com mais de 1 milhão de torcedores (aqui exclui-se o Fortaleza EC que não tem participações na Série A desde 2007).

Constata-se que nem sempre o tamanho da torcida induz o número de participações dos respectivos times na Série A. O Figueirense-SC, por exemplo, é um “anão” se comparado aos gigantes Ceará-CE e Santa Cruz-PE, mas tem larga vantagem em presenças na Série A desde 2007 (seis vezes).

Além disso, o tamanho da torcida nem sempre apresenta uma correlação direta com a média de pagantes nos estádios. Ceará encontra-se na Série B e tem uma média de assistências de torcedores idêntica a Coritiba-PR e Sport-PE, e bem superior ao Vitória-BA.

Ou seja, tamanho da torcida per si não significa assistências e receitas. Outros fatores são importantes: momento do time, preço dos ingressos, ações promocionais, contexto social e econômico, entre outros. Na verdade, cabe a diretorias e gestores criarem novas formas de encaixe financeiro e acreditarem mais no seu próprio torcedor, “cliente”.

O site Globo Esportes atualiza regularmente a ocupação média dos estádios brasileiros e a receita bruta auferida pelos clubes. Importa verificar que o Ceará-CE tem apresentado a média do ingresso mais baixa do grupo de times com o mesmo perfil (lembrando: times que desde 2007 já participaram ou ainda se encontram na Série A, exceto os 12 gigantes do futebol brasileiro).

Receitas e despesas maquiadas

Avaliando o faturamento, receitas e despesas, superávits e déficits dos clubes de futebol brasileiro entra-se em um terreno extremamente pantanoso devido à falta de informações corretas e precisas.

Alguns times aderiram ao Profut – Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro – lei sancionada em 2015 para ajudar os clubes a quitarem as suas dívidas com a União. Os interessados puderam refinanciar as suas dívidas fiscais num prazo de 20 anos (240 parcelas) com redução de 70% das multas e 40% dos juros.

Na verdade, o Profut pretende ser um mecanismo de transparência e modernização das gestões dos clubes devido às contrapartidas. Por exemplo, o atraso no pagamento dos direitos de imagem ficou sujeito a punição e ficou proibida a antecipação de verbas, como as cotas de TV. Aliás, o balanço financeiro dos clubes mostra que existe uma dependência exagerada das receitas de TV. Por isso, nem todas as agremiações aderiram ao programa, por sugestão dos respectivos conselhos fiscais, para poderem inserir nos seus orçamentos a antecipação das luvas referentes aos contratos assinados de 2019 a 2024. Os efeitos negativos desta maquiagem surgirão daqui a poucos anos.

Então, é urgente perceber o que tem faltado aos clubes do Nordeste para terem uma participação substancial no campeonato da Série A. Constata-se que não falta mercado, pois as torcidas são enormes. Falta gestão moderna? Influência política?

Os “gigantes com pés de barro” esperam melhores dias e com a subida garantida do Fortaleza à Série B e o provável acesso do Ceará à Série A, a palavra fica as diretorias dos gigantes cearenses.

*Alexandre Gonzaga é jornalista e chegou ao Ceará em 1999. Trabalhou com produção de TV e imprensa em Portugal. É um apaixonado por futebol.

About the Author

Fernando Graziani

Fernando Graziani é jornalista. Cobriu três Copas do Mundo, Copa das Confederações, duas Olimpíadas e mais centenas de campeonatos. No Blog, privilegia análise do futebol cearense e nordestino.

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