Por Mika Andrade*
não cabe
Não cabem nesse poema
As mortes
Os estupros
A violência
A fome
Nesse poema não cabe
O desejo insaciável do presidente por um pãozinho com leite condensado
A miséria que consome a barriga de muitas crianças
Nesse poema não cabe
Os animais que foram engolidos pela lama da Vale
Nesse poema não cabe
A polícia que mata jovens negros e periféricos
Nesse poema não cabe
Todos os racistas passa pano
(A morte é ruído profundo e barulhento)
E o que você faria
Pela segurança de pessoas condenadas
Ao esquecimento
Negligenciadas e apagadas
Diante de nós apenas o horror
Sangue lama e fogo
Vazando escorrendo queimando
Atravessando céus e mares
Soterrados em terra
O grito
O grito
Forte & alto
Foi brutalmente silenciado
Cruelmente sufocado
O ranger de dentes das hienas
Se misturam ao barulho dos asnos
***
Mika Andrade é poeta. Publicou a zine alguns versos pervertidos e outros indecorosos (2016/2018) e organizou a antologia erótica de poetas cearenses O Olho de Lilith (Selo Ferina).