Reprodução da coluna “Política”*, edição de 22/11/2016 do O POVO.

Michel Temer e as duas portas estreitas

Suponho que o presidente Michel Temer esteja maldizendo a hora em que resolveu recuar de sua proposta inicial de acabar com o Ministério da Cultura, agregando-o ao da Educação. Pois, da Cultura, vem a mais nova crise do governo, que não consegue sair do atoleiro, apesar de a palavra “crise”, antes tão desperta, estar agora dormitando na gaveta de muitos editores.

PRESSÃO
Geddel Vieira Lima, titular da Secretaria de Governo, é acusado pelo demissionário ministro da Cultura, Marcelo Calero, de pressioná-lo para que interviesse no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, de modo que o Iphan liberasse uma construção em área tombada em Salvador. (O Iphan é subordinado ao Ministério da Cultura.)

PONDERAÇÕES
Geddel, que adquiriu um apartamento no tal prédio (para o qual o Iphan autorizou 13 andares, mas querem construir 30), confirmou ter falado várias vezes com Calero. Mas disse terem sido apenas “ponderações”, pois ele estava preocupado com a “segurança jurídica” e com os empregos que se perderiam caso prevalecesse a restrição do Iphan.

HOMEM DE CONFIANÇA
Se fosse um político qualquer, vá lá, mas Geddel é “homem de confiança” do presidente Michel Temer – um governo comprometido com o fim da bandalheira, certo? O fato de Geddel ter interesse pessoal no empreendimento, por óbvio, fica subordinado às suas preocupações de homem público. E ele faria as “ponderações”, acreditemos, mesmo que fosse para prejudicar seus interesses particulares. Afinal, está em jogo a “segurança jurídica” e seu sofrimento com desemprego na capital baiana. Por que duvidar? Então, Calero deve ter confundido as boas intenções de Geddel com abuso de autoridade.

RESPONSABILIDADE
Bem, mas caso Calero tenha sido mesmo pressionado – pensemos apenas por hipótese -, também não soaria estranho depois que um procurador, campeão na luta contra a corrupção (Deltan Dallagnol), fez lobby para que a sua própria categoria ficasse isenta de responder por crimes de responsabilidade, em caso de possíveis condutas irregulares.

PROBLEMA
E o presidente está agora naquela típica situação: se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Se tirar Geddel, é a confissão que um de seus principais auxiliares cometeu irregularidades; mantendo-o, o problema permanecerá na antessala. Geddel diz que não pede para sair e Temer diz que não vai demiti-lo. Porém, em casos assim, o afastamento sempre é precedido de negativas.

SÃO CINCO
Com a saída de Marcelo Calero, somam-se cinco ministros que caíram nos seis meses de governo Temer. Os outros foram Romero Jucá (Planejamento), Fabiano Silveira (Transparência), Henrique Alves (Turismo) e Fábio Osório (Advocacia-Geral da União). Jucá e Alves acusados de irregularidades.

SEGURANÇA
Policiais reivindicam a criação de uma delegacia especializada para investigar homicídios contra a categoria. Eles consideram injusto existir uma delegacia para apurar crimes cometidos por policiais e a ausência de outra, nos mesmos moldes, para averiguar ações contra eles. A reivindicação é fator de tensionamento com a Secretaria da Segurança.

POLICIAIS
O secretário Delci Teixeira escreveu artigo neste jornal (18/11/2016) afirmando que crimes contra policiais são investigados com rigor e rapidamente. Segundo Teixeira, o índice de resolução dos casos em 2015 (14 policiais mortos) e 2016 (25 homicídios) ficou em torno de 80%. De modo geral, o índice de resolutibilidade de homicídios no Ceará não passa de 23%; ou seja em 77% dos casos de crimes letais contra a vida os criminosos ficam impunes.

*Em substituição ao titular Érico Firmo , que está de férias.

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