Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, edição de 4/10/2018 do O POVO.

O movimento do ministro

O fato de o Brasil não ter acertado suas contas com a ditadura civil-militar, já escrevi mais de uma vez, permite que os fantasmas do passado continuem nos assombrando. Nossos vizinhos de infortúnio – como Uruguai, Argentina e Chile, por exemplo – levaram aos tribunais os militares responsáveis pelos crimes cometidos no período ditatorial. E, hoje, as suas Forças Armadas submetem-se ao seu papel constitucional, mantendo-se ao largo de assuntos políticos.

No mês passado o comandante do Exército do Uruguai, general Guido Manini Ríos, criticou o ministro do Trabalho devido a uma reforma que o país pretende implementar no sistema militar de aposentadorias. Foi punido pelo presidente uruguaio com 30 dias de detenção. Por aqui alguns militares se atribuem até o papel de sociólogos, fazendo análises políticas de candidaturas, e tudo fica por isso mesmo.

Não bastasse isso, vem o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, apresentar-se como revisor da história, dizendo ter adotado uma nova terminologia para a ditadura: “Hoje, não me refiro nem mais a golpe nem a revolução. Me refiro a movimento de 1964”. O ministro justificou a sua mudança de vocabulário, dizendo que esquerda e direita tiveram responsabilidade “no momento da tomada do poder pelas Forças Armadas”, mas depois julgaram “conveniente” culpar os militares. Para fundamentar a sua tese, Toffoli citou o historiador Daniel Aarão Reis, que se apressou em dizer que a sua análise do período nada tinha a ver com o que dissera o ministro.

Até o general (quatro estrelas) Guilherme Theóphilo, candidato a governador do Ceará pelo PSDB, fez melhor do que Toffoli. Ele se nega a chamar a coisa pelo nome, mas admite que, no período, houve um “regime de exceção”, que não seria uma ditadura, mas um “regime forte”.

A propósito, assim que Toffoli assumiu a presidência do STF ele nomeou como assessor um general da reserva (também de quatro estrelas), Fernando Azevedo e Silva, que fora chefe do Estado Maior até julho. Ele disse que a escolha levou em conta “critérios objetivos de habilidades e competências”. Certo, mas só lembrando: existem muitos civis com as mesmas características.

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