capajoseolympioNunca fiz nada sozinho. Certo ou errado, os passos desta Casa foram divididos entre mim, meus irmãos, filhos, minha mulher. Não há uma razão específica para o sucesso da editora. As coisas apenas acontecem.

José Olympio

[Apud José Mario Pereira (org.). José Olympio: O editor e sua casa. Rio de Janeiro: Sextante, 2008, p. 8]

 

Em entrevista concedida ao jornal O Globo em 30 de abril de 1981, citada por José Maria Pereira no livro “José Olympio: O editor e sua Casa”, do qual foi o organizador, declarava o escritor e acadêmico Adonias Filho: “Não creio que se possa levantar a história da cultura brasileira, nos últimos cinquenta nos, sem que se torne obrigatória a imediata citação de José Olympio. Hoje, quando a Casa que fundou completa o cinquentenário, é bom lembrar o paulista de sangue baiano que chegou no Rio após a revolução de 1930. E chegou para cumprir uma missão complexa e difícil que era a de articular o escritor brasileiro com o povo (…)” (p. 56).

Muito mais que admirar,  passei a amar José Olympio depois que, indo ao Rio de Janeiro, em agosto de 2008, tive oportunidade de visitar na Biblioteca Nacional a exposição intitulada “José Olympio: o editor e sua Casa”.

José Olympio Pereira Filho nasceu em no município de Batatais, São Paulo, em 1902.  Em 29 de novembro de 1931 fundou, na cidade de São Paulo, a Livraria José Olympio. Três anos mais tarde o editor se mudaria para o Rio de Janeiro, instalando ali sua empresa.

A propósito, informa José Mario Pereira: “Em 1934 José Olympio muda-se para o Rio de Janeiro e, com ajuda de intelectuais como Humberto de Campos e Armando Fontes, instala a Livraria José Olympio Editora na Rua do Ouvidor, 110, no que logo se tornará o endereço de maior prestígio da literatura nacional, onde será possível encontrar todos os grandes escritores do momento: Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz. O endereço logo se tornou um pólo aglutinador de cultura, e muitas amizades entre autores depois famosos foram ali sedimentadas. Os romancistas do Nordeste, como “mestre Graça” – que tinha até um banco só seu -, ganharam do jornalista Gondim da Fonseca, em artigo no Correio da Manhã, o epíteto de ‘a jagunçada do José Olympio'” (p. 10).

A Casa, como a editora se tornaria amavelmente conhecida pelos amigos  e escritores editados por José Olympio,  publicou a maioria dos grandes autores brasileiros do século XX. A Coleção Documentos Brasileiros, publicada ao longo de mais de meio século, perfazendo mais de duzentos volumes, inclui-se entre uma de suas grandes contribuições à cultura brasileira.

Em entrevista concedida ao jornal O Estado de S. Paulo em 4.5.1990, um dia após a morte de José Olympio, o escritor Antonio Carlos Villaça, autor da biografia ‘José Olympio – O descobridor de escritores’, declarou:

“O Brasil estava no centro das preocupações dele. Toda sua vida, toda a sua conversa, todo o seu dia era Brasil. Era um conversador fascinante, informadíssimo. Lia todos os jornais, todos os editoriais, todos os artigos, tudo. Recebia pessoas as mais diversas. A sala cheia de livros era um ponto de encontro da vida intelectual brasileira. Houve sempre um profundo e sadio sentido nacionalista no trabalho de José Olympio. Tristão de Athayde gostava de chamá-lo o Duque de Olinda. Havia nele uma aristocracia natural, uma elegância de maneiras, uma dignidade que o tornou uma das figuras mais respeitadas do Brasil entre 1940 e 1990, ao longo de meio século” (p. 49).

A escritora cearense Rachel de Queiroz conta-se entre as mais devotadas amigas do editor. Depois que se tornou famosa, recebeu várias propostas para mudar de editora, rejeitando-as todas. Somente após a morte de José Olympio, a autora de “O Quinze” aceitaria mudar de editora. Mesmo assim, pouco tempo depois, seus livros voltaram a ser editados pela Casa.

Num texto em que pranteia a morte de Moacyr de Almeida, primo de José Olympio e um de seus colaboradores, Rachel de Queiroz escreveu o que pode ser considerado uma das mais belas homenagens que alguém poderia prestar a um editor, e que mereceu ser transcrita em destaque em uma das paredes da exposição na Biblioteca Nacional. Diz a nossa conterrânea escritora:

“Lidando com essa mercadoria frágil, cheia de surpresas, de caprichosa ventabilidade que é o livro, mercadoria que não é feita só de palavras, porque também é papel, impressão, transporte, e que também não é só papel cortado e costurado, são idéias, palavras, histórias, poesia, sonho – literatura -, o editor que manda imprimir poesias e romances em livros, e toma como profissão comerciar com essas poesias e romances, é, em verdade, mais sonhador, menos prático, mais jogador que o poeta e romancista autores daqueles livros” (p. 373).

Em 1984 a Livraria José Olympio Editora é adquirida por Henrique Sérgio Gregori, amigo pessoal de José Olympio. Com a morte de Gregori, ocorrida em 1990, o controle da Editora passa para seus filhos, que a vendem ao grupo Record em 2001, permanecendo com eles, porém, o arquivo da Casa.

Em 2006, a família Gregori doa todo o acervo à Biblioteca Nacional, o qual inclui, além de uma grande quantidade de fotografias e documentos, um exemplar de todos os livros publicados pela José Olympio. Com o material desse acervo foi organizada a exposição “José Olympio: O editor e sua casa”, da qual resultou o livro aqui comentado.

28_mvg_olympio2Na Biblioteca Nacional, demorei-me bem mais de uma hora passeando por entre as edições originais, cartas, fotografias e outros documentos que fizeram a história da Casa. Ao sair, me dirigi à Livraria da Travessa, uma das melhores do Rio de Janeiro, com o objetivo de adquirir uma edição do livro objeto deste texto. De volta ao hotel, à medida em que o folheava, sentia crescer em mim um imenso amor pela figura extraordinária de José Olympio, um homem que dedicou a vida à cultura e às letras brasileiras.

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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