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Vasco Arruda

677 Articles

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

Vasco Arruda

A Guematria de nun é cinquenta. Há cinquenta “portões” ou níveis de Biná, entendimento. É por isso que os judeus contaram quarenta e nove dias – sete semanas completas de Pessach a Shavuot – para se prepararem a receber a Torá. A famosa questão é: por que a Torá nos diz para contar cinquenta dias após Pessach, quando imediatamente depois diz para contar sete semanas completas, que são apenas quarenta e novo dias? A resposta é que um indivíduo somente pode alcançar quarenta e nove níveis de intelecto por si mesmo. O quinquagésimo nível, aquele da transcendência, somente pode ser fornecido por D’ us. Portanto D’us diz: Vocês façam o seu e Eu farei o Meu. Se vocês atingirem o quadragésimo nono nível, Eu os abençoarei com o quinquagésimo; a camada mais elevada de Biná, entendimento.
Rabino Aaron Leib Raskin
[Rabino Aaron Leib Raskin. A luz das Letras do Alfabeto Hebraico. Tradução de Solange Porto; iniciativa e revisão de Marcia Eliezer. São Paulo: Editora Lubavitch – Brasil, 2011, p. 107.]

Vasco Arruda

Porque este mandamento que hoje te ordeno não é excessivo para ti, nem está fora do teu alcance. Ele não está no céu, para que fiques dizendo: “Quem subiria por nós até o céu, para trazê-lo a nós, para que possamos ouvi-lo e pô-lo em prática?” E não está no além-mar, para que fiques dizendo: “Quem atravessaria o mar por nós, para trazê-lo a nós, para que possamos ouvi-lo e pô-lo em prática?” Sim, porque a palavra está muito perto de ti: está na tua boca e no teu coração, para que a ponhas em prática.
Eis que hoje estou colocando diante de ti a vida e a felicidade, a morte e a infelicidade.
Se ouves os mandamentos de Iahweh teu Deus, andando em seus caminhos e observando seus mandamentos, seus estatutos e suas normas -, viverás e te multiplicarás. Iahweh teu Deus te abençoará na terra em que estás entrando a fim de tomares posse dela. Contudo, se o teu coração se desviar e não ouvires, e te deixares seduzir e te prostrares diante de outros deuses, e os servires, eu hoje vos declaro: é certo que perecereis! Não prolongareis vossos dias sobre o solo em que, ao atravessar o Jordão, estás entrando para dele tomar posse. Hoje tomo o céu e a terra como testemunhas contra vós: eu te propus a vida ou a morte, a bênção ou a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas tu e a tua descendência, amando a Iahweh teu Deus, obedecendo à sua voz e apegando-te a ele. Porque disso depende a tua vida e o prolongamento dos teus dias. E assim poderás habitar sobre este solo que Iahweh jurara dar a teus pais, Abraão, Isaac e Jacó.
Dt 30,11-20
[Bíblia de Jerusalém. Gorgulho, Gilberto da Silva; Storniolo, Ivo; Anderson, Ana Flora (Coord.). Tradução do texto em língua portuguesa diretamente dos originais. 4ª reimpressão. São Paulo: Paulus, 2006, p. 296.]

Vasco Arruda

Encontramos em toda pessoa a ideia do Adão Cadmon – o Cristo em nós. Cristo é o segundo Adão, o que corresponde nas religiões orientais à ideia do atmã ou do homem total, do homem original, o homem “todo redondo” de PLATÃO – que é simbolizado por um círculo ou por uma pintura com motivos redondos. Encontramos todas essas ideias na mística medieval, na literatura alquimista em geral, desde o primeiro século da era cristã. Encontramo-las no gnosticismo e encontramos muitas delas naturalmente no Novo Testamento, em Paulo. Mas é um desenvolvimento absolutamente consistente da ideia de Cristo em nós – não o Cristo histórico fora de nós, mas o Cristo dentro de nós; e o argumento diz que é imoral deixar Cristo sofrer por nós, que ele já sofreu que chega e que devemos finalmente carregar nossos próprios pecados e não colocá-los sobre Cristo – nós todos deveríamos carregá-los em conjunto. Cristo expressa a mesma ideia quando diz: “Eu estou presente no menor de vossos irmãos”. E o que dizer, meu caro, se o menor de teus irmãos fosse você mesmo – o que dizer então? Então você percebe que Cristo não deveria ser o menor em sua vida e que nós temos um irmão dentro de nós que é realmente o menor de nossos irmãos, muito pior que o pobre mendigo a quem demos comida. Isto significa que temos dentro de nós uma sombra, alguém muito mau, alguém extremamente pobre, mas que precisa ser aceito. O que fez Cristo – sejamos bem banais – quando o consideramos como ser puramente humano? Cristo foi desobediente à sua mãe; Cristo desobedeceu à sua tradição; Cristo se apresentou como enganador e representou esse papel até o amargo fim; ele sustentou sua hipótese até seu triste fim. Como nasceu Cristo? Na maior miséria. Quem era seu pai? Era filho ilegítimo – do ponto de vista humano, uma situação lamentável: uma pobre moça que tinha um filho pequeno. Isto é o nosso símbolo, isto somos nós; nós somos tudo isto. E se alguém viver sua própria hipótese até o amargo fim (e tiver que pagar talvez com a morte) saberá que Cristo é seu irmão.
C. G. Jung
[Jung, C. G. III. A vida simbólica. Em: Jung, C. G. A vida simbólica: escritos diversos. Tradução de Araceli Elman, Edgar Orth; revisão literária de Lúcia Mathilde Endlich Orth; revisão técnica de Jette

Vasco Arruda

Abraçava a Mãe de Jesus com indizível amor, pelo fato que ela tornou irmão nosso o Senhor da Majestade (cf. Sl 28,3). Cantava-lhe louvores especiais, derramava preces, oferecia afetos tantos e tais que a língua humana não poderia exprimir. Mas o que mais nos alegra é que ele a constituiu advogada da Ordem e confiou à sua proteção os filhos que haveria de deixar para serem aquecidos e protegidos (cf. Sl 16,8) até o fim. – Ó advogada dos pobres! Cumpri para conosco o ofício de tutora até ao tempo predeterminado pelo Pai (cf. Gl 4,2)!
Frei Tomás de Celano
[Frei Tomás de Celano. Segunda vida de São Francisco. Em: Fontes Franciscanas e Clarianas. Apresentação Sergio M. Dal Moro; tradução Celso Márcio Teixeira… [et. al.]. 2ª. ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2008, p. 424.]

Vasco Arruda

Desta vez foi em plena rua que ele se manifestou. Fiquei surpresíssimo, pois algo semelhante nunca me acontecera. Mas ele se manifestou, e o fez de uma forma totalmente inusitada. Na verdade, não era exatamente ele, mas passei por uma experiência tão estranha e surpreendente que, pelas características, só poderia mesmo ser coisa dele. E o curioso é que, a princípio, nem me dei conta do que estava acontecendo. Na verdade, somente alguns dias depois comecei a juntar as peças e montar o quebra-cabeças; foi aí que pude discernir o motivo para o que estava me acontecendo, qual era a fonte e que mensagem estava sendo transmitida.

Vasco Arruda

Deixando de lado aqueles que, diante dos conteúdos religiosos, não têm a coragem nem da fé nem da descrença, resta-nos a situação incômoda do homem contemporâneo, dividido entre, de um lado, a existência de certos fatos de fé aos quais sua consciência intelectual não admite acesso e, de outro, a afirmação de pensadores eminentes com supremo poder intelectual de que a realidade dessas crenças está acima de qualquer dúvida. Tal pessoa sofre o sentimento angustiante de que lhe falta alguma percepção sensorial pela qual outros percebem algo real onde ela poderia jurar que não há, nem pode haver, nada.
[Simmel, George. Religião: ensaios volume 1 /2. São Paulo: Olho d´Água, 2009. Ensaio 2, O problema da situação religiosa, tradução de Antonio Carlos Santos, p. 10]

Vasco Arruda

Devo a Victor Smirnoff algo de muito íntimo no meu modo de ser psicanalista. Algo que ele me transmitiu ou que ele permitiu que eu me apropriasse – e acho que essas duas possibilidades não se excluem. Há o homem com seu humor, sua vivacidade, a inteligência e a elegância, seu interesse pela literatura, pelo cinema, pelo teatro, pela música, pela pintura, pela política e pela vida comum da cidade. Era possível adivinhar o gourmand, o homem do mundo. Bem como a possibilidade das cóleras, das intransigências. Sua paixão pela psicanálise, seu engajamento no trabalho, a ética, a transversalidade em relação às teorias. Tudo isso, mais a invenção permanente do encontro, estava sempre presente, constituía o tecido de sua presença e, no entanto, não explica um contentamento alegre que sustentava, que estimulava. Eu me sentia no aconchego, era gostoso estar com ele pensando junto, era confortável, cosy, intenso.
Heitor O ´Dwyer de Macedo
[Macedo, Heitor O´Dwyer de. Cartas a uma jovem psicanalista. Tradução Claudia Berliner. São Paulo: Perspectiva, 2011, p. 157. (Estudos; 285)]

Vasco Arruda

A expressão da bondade fundamental está sempre ligada à benevolência – não uma benevolência morna, débil, água-com-açúcar, mas uma benevolência íntegra, animada, uma benevolência de quem tem ombros e cabeça aprumados. A benevolência, nesse sentido, provém da experiência da não-dúvida, da ausência de dúvida. Ser livre de dúvida nada tem a ver com aceitar a validade de uma filosofia ou de um conceito. Não se trata de converter-se ou submeter-se a uma cruzada até já não se ter qualquer dúvida sobre as próprias crenças. Não estamos falando de pessoas que nunca têm dúvidas e que fazem proselitismo evangelizador, estando sempre prontas a se sacrificar por uma crença. Não ter dúvida significa confiar no coração, confiar em si mesmo. Não ter dúvida significa ter vivido a experiência de relacionar-se consigo mesmo, a experiência de sincronização entre mente e corpo. Quando a mente e o corpo estão sincronizados, não se tem dúvida.
Chögyam Trungpa
[Trungpa, Chögyam. Shambhala: A Trilha Sagrada do Guerreiro. Tradução de Denise Moreno Pegorim, supervisão, revisão técnica e notas de Lincoln Berkley. São Paulo: Cultrix,1997, p. 54.]

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Vasco Arruda

A vida individual, qualquer que seja o tipo de sociedade, consiste em passar sucessivamente de uma idade a outra e de uma ocupação a outra. Nos lugares em que as idades são separadas, e também as ocupações, esta passagem é acompanhada por atos especiais, que, por exemplo, constituem, para os nossos ofícios, a aprendizagem, e que entre os semicivilizados consistem em cerimônias, porque entre eles nenhum ato é absolutamente independente do sagrado. Toda alteração na situação de um indivíduo implica aí ações e reações entre o profano e o sagrado, ações e reações que devem ser regulamentadas e vigiadas, a fim de a sociedade geral não sofrer nenhum constrangimento ou dano.
Arnold Van Gennep
[Gennep, Arnol Van. Os ritos de passagem: estudo sistemático dos ritos da porta e da soleira, da hospitalidade, da adoção, gravidez e parto, nascimento, infância, puberdade, iniciação, coroação, noivado, casamento, funerais, estações, etc. 2ª. ed. Tradução de Mariano Ferreira, apresentação de Roberto DaMatta. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011, p. 24.]